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Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica
Ágora (Rio J.)
1516-1498
1809-4414
Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Abstract:
This article takes up the drive for empowerment, understanding its action as a creationist power, and an active force since the origins of psychic life. We start with Freud and other contemporary authors to explore it, indicating their creationist activity in the psyche, which reappears in a particular practice in the clinic. Methodologically, we resorted to the work of art and play, demonstrating the specificity of such drive, clarifying its dynamics. Finally, we underline the expressions of creation in two directions, one that reduces the subject’s positions in culture, culminating in symptoms, and the other vector, of creation in the insistence towards reinvention. in addition to repetitions.
INTRODUÇÃO
A questão da criação, da arte e do brincar constitui um rico laboratório de observação e estudo tanto da teoria quanto da prática psicanalítica. No início da construção do campo da psicanálise, Freud (1900/1996, 1905/2016a) apresentou sua teoria dos sonhos e da sexualidade, nas quais a dimensão da criação já se apresentava indiretamente como elemento fundamental das manifestações psíquicas. Entretanto, à medida que suas interrogações sobre o funcionamento da psique avançavam, a abordagem dos fenômenos do brincar e da arte tornou-se central e passou a ser diretamente observada, permitindo-lhe refinar a proposta da psicanálise como um instrumento para analisar o homem e a cultura.
Tendo em vista esse tema constante no campo da psicanálise, nosso objetivo aqui é examinar minuciosamente os aspectos da criação na constituição psíquica, em uma estreita relação com a teorização das pulsões. Para tanto, além dos fundamentos estabelecidos por Freud, de onde partimos, recorreremos à contribuição de alguns estudiosos da teoria psicanalítica como Lacan (1959-1960/2008), Aulagnier (1979), Didier-Weill (2012, 2016).
De início, destacamos algumas atividades que expressam o trabalho de criação e sublinhamos os elementos envolvidos na construção subjetiva, que não são exclusivos das patologias, como o brincar, a repetição, a alucinação, a fantasia e a escrita literária e pictográfica. Nesta proposta, sustentamos a noção de criação como inerente tanto ao “fazer” da arte como ao brincar. Retomamos o raciocínio de Freud (1905/2016a; 1908/2015) ao empregar certa equivalência entre o “fazer” presente no brincar e na arte, explicando por essa via as raízes da produção artística.
Nosso entendimento é o de que podemos extrair ensinamentos fundamentais dessas aproximações, o que justifica nosso retorno e exploração das observações freudianas, relacionando-as ao tema da pulsão de apoderamento. Todavia, prescindimos de Freud neste território, resgatando a ação da pulsão de apoderamento em seu estatuto distinto do da pulsão de morte, como bem assinalaram Trevisan et al, (2022b). Isso nos permitirá ilustrar sua especificidade nos dois “fazeres” aqui em questão, a arte e o brincar, para então entrelaçá-los ao “fazer” da experiência psicanalítica.
Ainda na perspectiva de Freud, observamos um “fazer” análogo no tratamento psicanalítico, presente tanto no trabalho do psicanalista quanto no do sujeito do inconsciente. Trata-se de abordar o trabalho do psicanalista e o do sujeito do inconsciente. Ora, do lado do primeiro, cabe a criação por extração, cuja referência Freud (1905/2016b) toma da arte do escultor (via de levare), enfatizando o trabalho da retirada de conteúdo, e não do pintor (via de porre), imposição de material. Sobre a extração que ocorre no interior de uma análise, destacamos a criação por parte do analista, que lhe impõe um “fazer” ético, que em muito extrapola a estética moral social que vem do outro. Já do lado do sujeito/analisando, a criação se expressa em uma diversidade singular, no discurso, no corpo-sintoma, na repetição e/ou em seu ato.
O núcleo comum entre a arte e o brincar, assim como entre a ação do analista e a do sujeito, reside no “fazer”, cujas funções se aproximam. Por exemplo, a arte do psicanalista se assemelha à do escultor, ao extrair a partir da escuta, servindo ao inconsciente. Por outro lado, o sujeito se apresenta na análise com seu brincar insistente, incluindo a encenação e os jogos infantis, que, como Freud apontou, constituem a transferência.
Dessa forma, podemos aprofundar as considerações sobre a reavaliação da pulsão de apoderamento e seus impactos diretos na metapsicologia freudiana. Para isso, formulamos a seguinte questão: qual a relação entre o “fazer” do analista e do analisando com a pulsão de apoderamento? Esta é uma das perguntas que guia transversalmente esta exposição.
Para articular essa questão, é necessário esclarecer dois pontos fundamentais, sem os quais a construção teórica se tornaria anátema e sem valor, recaindo em repetições vãs. O primeiro ponto é enfrentar a problemática tradutória e conceitual em torno da pulsão de apoderamento; o segundo é definir sua ação e alcance conceitual.
Faremos uma breve exposição de ambos os pontos. Segundo Trevisan (2021), o conceito de “pulsão de apoderamento” é encontrado na literatura de modo raso e inespecífico, sobretudo nos termos de uma “pulsão de dominação”, em decorrência das interpretações tradutórias do termo original, Bemächtigungstrieb. Na mesma perspectiva Trevisan et al. (2023) expuseram uma leitura crítica destes aspectos, reiterando particularidades dessa conceituação, e defenderam a tradução do termo original por “pulsão de apoderamento”, em vez de “dominação”, compreendendo-a da seguinte maneira: impulso e força que atuam desde os primórdios da constituição do Eu em sua relação com o mundo, objetivando o apoderar-se da experiência para fazer possível um lugar. Feita tal introdução, podemos avançar no que tange à atividade da criação na arte e no brincar.
Vamos abordar o texto “O escritor e a fantasia” (FREUD, 1908/2015) como fonte inicial para tratarmos os termos da criação, articulando em seguida seus desdobramentos com o ato do analista em seu manejo, que parte das margens do universal ao atravessamento singular. Na mesma direção, sublinharemos a atividade do brincar como um dos primeiros movimentos de criação do sujeito, isto é, a arte do brincar como evidência fundamental do trabalho da pulsão de apoderamento.
A política da criação: o apoderamento entre a arte e o brincar
“O oposto da brincadeira não é a seriedade, mas sim a realidade”
(FREUD, 1908/2015, p. 327)
Freud (1908/2015) analisou o processo criativo referindo-se ao exercício do poeta, destacando suas habilidades em retratar a vida de um ponto de vista peculiar, cuja forma conjuga realidade e fantasia, em uma proximidade ímpar e incomum. No entanto, esta condição é decorrente de experiências muito rudimentares da infância, como uma leitura particular frente às primeiras experiências com a realidade externa. Ainda segundo o autor,
[...] os próprios escritores amam diminuir a distância entre a sua categoria e os homens comuns; frequentemente nos garante que em cada indivíduo se esconde um poeta e que o último poeta desaparecerá com o último homem. (FREUD, 1908/2015, p. 326).
Para compreender a criação do artista e a experiência do brincar, incluindo o trabalho do analista, retomamos a noção de “pulsão de apoderamento”, compreendendo-a como presente em cada indivíduo. Empregamos a definição conceitual no mesmo sentido de Trevisan et al. (2022a, p. 2), “como impulso à exploração da relação com o mundo”, ou seja, uma força atuante na tomada da realidade material, portanto, operando efetivamente nas origens da vida psíquica, ocasionando a experiência com alteridade. A releitura proposta é muito similar à posição defendida por White (2010, p. 819) para o Bemächtigungstrieb, sugerindo, como desdobramento semântico para este conceito, a ideia de uma “força para ganhar poder”.
Vale lembrar a forma como Freud (1905/2016a) introduziu o papel da pulsão de apoderamento, assinalando que sua força (Drang) compõem diretamente o conceito de pulsão (Trieb), declinando-a nas expressões de Bemächtigungstrieb e de Bewältigungstrieb. Freud (1905/2016a; 1920/2020) formulou algumas notas sobre a pulsão de apoderamento, adjetivando-a como força organizativa da sexualidade pré-genital e como uma pulsão não sexual. No entanto, esse ponto ainda constitui um “calcanhar de Aquiles” na teoria, gerando uma posição generalista que, em muitos casos, equipara a pulsão de apoderamento à pulsão de morte, tese defendida por autores como Cardoso (2002), Caropreso (2013) e Efeken (2017), mas da qual discordamos.
Diferentemente do que já se produziu no Brasil a respeito desta temática, encontramos em outros autores as condições para retomar detalhadamente a investigação, principalmente entre aqueles da escola francesa. É o caso do passo inicial dado por Grunberger (1959), que propôs traduzi-la por “pulsion d’emprise”. Na mesma linha, alguns teóricos abordam diretamente o assunto como mais amplitude, entre eles Assoun (1989), Barbier (1992) e Sédat (2009), os quais insistem em retomar a historicidade do termo. Sobretudo, nos chama atenção a colocação de Barbier (1992), que situou precisamente os primórdios do apoderamento no desenvolvimento motor, remontando às experimentações reguladoras da relação com o mundo. O autor ampliou as considerações nas modalidades de “emprise, action, origine”, oferecendo uma noção de apoderamento como uma força destinada a operar sobre o mundo, uma concepção que se aproxima bastante da contribuição que desenvolvemos aqui.
Também consideramos ser pertinente recorrer a Didier-Weill (2012, 2016) para evidenciar os aspectos inerentes à força pulsional, teorização que abarca o impulso e anseio que efetivam uma ligação. É nesse cruzamento entre sujeito e mundo, entre continuidade e descontinuidade, da diferença e do indiferente, que ocorre uma ação que tem como meta “se fazer”, o que sustenta a formação do sujeito do inconsciente. A partir desse princípio, situamos as vias do trabalho pulsional que visa ao “se fazer”, uma atividade que ainda não está relacionada ao Eros ou à pulsão de morte. Compreendemos o efeito dessa ação como um estatuto de fundação da psique no mundo, sendo necessária uma força que resista ao caos imposto pela realidade.
Avançando nesta exposição, podemos dizer que a pulsão de apoderamento opera a partir do impossível da compreensão e da apreensão totalitária da experiência vivida desde a entrada do bebê no mundo, o que impulsiona a atividade de criação substitutiva como saída frente à descontinuidade que as contingências materiais apresentam. Freud (1905/2016a) notou os aspectos da montagem do psiquismo ligadas a pulsão de apoderamento, chamado de aparelho muscular, para constituir instrumentos do controle das excitações e fabricar objetos.
Tendo em vista os argumentos acima, parece-nos possível refinar a questão inicial: qual é a diferença nas operações da pulsão de apoderamento na atividade artística e do brincar? E em que sentido esta exploração pode contribuir para a prática clínica? Nas vias de construção de uma resposta plausível, recorramos ao seguinte apontamento de Maud Mannoni (1988/1990):
A pulsão criadora escapa ao observador e é dificilmente captável. Diríamos que ela se confunde com um modo de vida, que, na origem, se manifesta no jogo. Dito de outro modo, uma necessidade interior impulsiona o sujeito a escrever, mas a qualidade da obra produzida depende até certo ponto do desejo de se comunicar com o outro, ou ainda transcender, com as palavras a morte. (MANNONI, 1988/1990, p. 134)
A psicanalista francesa, simpatizante do ensino de Lacan, notou o trabalho perspicaz da pulsão, nomeando-a de criadora, e indicou sua presença enquanto potência para criação psíquica.
O ato do brincar, como já observara Freud (1920/2020), constitui um tipo de invenção que só é possível se o sujeito toma algo da experiência, se apossa, se agarra a algo experimentado do mundo, mesmo que seja por meio da produção onírica, do próprio dedo, da chupeta, do carretel de linha. Esse aspecto foi enfatizado por Anzieu (1981) que, em suas construções teórica sobre o Eu-Pele, já teorizava sobre o ímpeto da tomada do mundo presente nas ações do bebê, que são sustentadas por uma rigorosa retrospectiva freudiana sobre a teoria das pulsões. O autor retomou as expressões “pulsion d´emprise” e “pulsion d´agrippement”, referindo-se ao trabalho de agarrar, e controlar a experiência psíquica, ainda em suas origens, para lidar com o mundo.
Em outro contexto, Trevisan (2021) abordou o termo francês “pulsion d´emprise” para reler a ação originária da pulsão, na forma de apoderamento, como condição sine qua non para instituir o Eu. Uma vez estabelecido o poder pelo Eu ainda arcaico - não apenas no sentido do domínio, mas também na direção de se apropriar e se organizar com a força -, abrem-se as possibilidades operatórias sobre o vivido, ou seja, sobre o mundo. Eis a expressão mais nítida da pulsão de apoderamento no ato do brincar, que tem como meta a tomada do mundo a fim de organizar seu próprio estado econômico, razão que pode ter levado Freud (1905/2016a) a tomá-la como não sexual e organizativa. Em outras palavras, é um poder fazer a partir do experimentado, o que implica eminentemente na diferenciação entre apropriar-se e apoderar-se; a segunda se refere ao fato de que a apropriação só é útil se aplicada aos interesses do aparelho psíquico.
Segundo Didier-Weill (2012), a criança sustenta uma relação muito diferente do adulto, mas isso não quer dizer que ela não saiba de seu estado; pelo contrário, ela sabe: o brincar é seu modo tanto de passar a saber, quanto de abrigá-lo. Já na arte, ainda que suas diferentes manifestações contenham um saber, trata-se de um saber velado, pois isso o coloca sob o olhar do outro sem, contudo, saber que o mostra. Esta condição artística embutida no tratamento psicanalítico remete a um ponto destacado por Vivès (2022), onde o analisante ocupa a cena de modo teatral, isto é, encena uma coisa que já foi escrita sem o saber, apresentando, assim, a dimensão em que se brinca de artista.
Esse ponto introduz a problemática do “fazer” na arte, já que nem todo sujeito consegue continuar o circuito do apoderamento sem adoecer. Mas o que há entre o brincar e a arte, além dos obstáculos impostos pela realidade? De acordo com a perspectiva desenvolvida aqui, o que está em jogo de maneira fundamental entre essas duas atividades se resume ao seguinte: no brincar, identificamos dois elementos. Primeiro, há a ânsia pela própria organização do corpo pulsional, sendo a pulsão uma força instituidora e organizadora. O segundo elemento envolve a posição diante do olhar do outro, o que diferencia a brincadeira da criação artística.
Em relação ao olhar, podemos dizer que, no brincar infantil, os poderes do Supereu não se efetivam como na fase adulta, nem da mesma maneira que na arte. Nos termos de Freud (1924/2011), a instância do Supereu é composta dos resquícios edipianos, orientando-se para o inter-ditar e o inibir. Por sua vez, Lacan (1959-1960/2008, p. 186) postulou o Supereu como “obsceno e feroz”, função motor dos imperativos do Ideal, cujas consequências inibidoras da criação, forjando mais a obrigatoriedade de repetição do que a reinvenção.
Não é novidade que, no brincar, as pulsões se expressam com mais liberdade. Isto já foi desenvolvido por Freud (1905/2016a), o que, inclusive, se associa à noção de “perversão polimorfa”. Dito isso, qual é a especificidade da pulsão de apoderamento no brincar? Ou: por que neste ato se torna evidente seu funcionamento? Já lançamos algumas observações sobre o brincar de modo a introduzir seu papel tanto na arte como no surgimento do aparelho da pulsão de apoderamento que, segundo Freud (1905/2016), é o aparelho muscular. Um exame detalhado desse aparelho nos fornece valiosas lições aplicáveis às nuances da prática clínica.
Longe de uma perspectiva biologicista ou determinante da fisiologia, tomamos o “muscular” no sentido freudiano. Na perspectiva freudiana, o aparelho muscular seria o meio pelo qual se operam as ações da psique, dentre as quais o controle das excitações, o que leva à produção de criações substitutas. Freud (1905/2016, p. 27) ressaltou que, “a bem da verdade, o corpo inteiro [é] uma forma de zona erógena”, ou, ainda, que “o sistema muscular serve a tal direcionamento”. Embora diga isso para explicar a natureza das pulsões, as mesmas indicações podem nos ajudar a elucidar o papel da pulsão de apoderamento no brincar. A condição se deve ao fato de que o experimento do novo é inerente ao infans; à medida que seu corpo se transforma, lhe é permitido arriscar-se com mais diversidade na relação com o mundo pela tomada de elementos constitutivos dele para si. Barbier (1992) também explorou esse aspecto, sustentando uma robusta articulação entre a psicanálise e as teorias do desenvolvimento motor, cujo fundamento instrumental reside nas operações do “apoderar-se”.
Dessa forma, o aparelho muscular constitui o dispositivo central no brincar e, por sua semelhança com a criação artística, deixa como herança a potência pulsional do organizar-se no mundo. Um exemplo esclarecedor e corriqueiro no cotidiano infantil é que as crianças fazem coisas com o corpo - ações ou movimentos ousados que exigem muito de sua estrutura orgânica ainda em desenvolvimento - que nunca ou raramente se ousa fazer na fase adulta, mesmo com melhores condições físicas.
Isso pode estar ligado ao fato de que, no brincar, o Supereu ainda não se consolidou a ponto de limitar e asfixiar as invenções. O aparelho desta pulsão ainda em formação contribui para a elasticidade da pulsão, permitindo que a criança, em sua brincadeira, se apodere dos objetos em maior pluralidade. Freud (1905/2016b) notou muito bem o impetus para conhecer o mundo e chegou a situar a curiosidade como um efeito ligado a esta pulsão. No mesmo sentido, Trevisan et al. (2022a) apontaram o traço epistemofílico da pulsão de apoderamento, que concentra o impulso de explorar o mundo, algo inerente às brincadeiras infantis.
Relembrando o enunciado de Maud Mannoni (1988/1990), que testemunhou o brincar como constitutivo do psiquismo, nota-se que ele se origina nos jogos e escapa ao observador, ele insiste na pulsão como a força que contém um traço inerente à criação. Isso não sugere uma nova classificação pulsional, mas indica que a pulsão de apoderamento é um traço presente em todas as pulsões, já que toda pulsão visa, de alguma forma, exercer seu poder. A mesma compreensão levou Gillibert (1981) a chamá-la de “a pulsão das pulsões”. Ora, basta observar qualquer criança que brinca sem ainda se importar com o olhar do outro para constatar que elas inventam suas próprias regras, fundam seus parâmetros imaginários, incluindo a tomada do mundo para servir ao seu modus operandi de estar nele.
Essa lógica reflete indiretamente a demanda subjacente às neuroses, que constantemente buscam a restauração de seus objetos/brinquedos. E é na crença de que o analista possui um “fazer” especial, compreendido como a restituição dos modos de gozo, que o trabalho analítico se torna possível. Com isso estabelecido, passamos agora às considerações diferenciais sobre o apoderamento no fazer artístico e suas implicações clínicas. Embora o campo das artes seja vasto e plural, é possível entrever uma lógica comum a todas as produções artísticas. No caso do artista, um fazer substancial ocorre. Maud Mannoni (1988/1990), em especial, teorizou sobre os escritores e revelou que:
[...] para permanecer eloquente e inventiva, a escrita é assim inseparável do que, no sujeito, não se deixou matar (por aquilo que ele viveu ou não de sua infância). É a esse preço que é possível salvar uma palavra da tirania que o homem exerce sobre seu próximo, e manter a liberdade interior de jogar com as palavras, feitos assim passarelas entre a vida e a morte. (MANNONI, 1988/1990, p. 135, grifo nosso).
A apresentação da autora contém uma especificidade que merece destaque, pois compreende uma alusão direta ao percurso pelo qual a pulsão de apoderamento constitui seu circuito. Examinamos a expressão “não se deixou matar”. Entendemos que ela sintetiza o tempo pulsional do apoderamento. Trata-se de observar que sua ação acontece no terceiro tempo da pulsão, que chamamos de apassivado.
Neste tempo lógico, também nomeado como “volta a si”, ocorre uma retenção da força para responder as contingências, resistindo às ameaças. Como consequência, o sujeito preserva força para se fazer vivente. Assim, este “não se deixou matar” materializa uma via de expressão criativa. Nessa lógica, estão as condições para se apropriar de significantes que o mantenham vivo, escapando da tirania do Outro, refletida nas aparições do Supereu. Vale ressaltar que a ideia de associar o Supereu à tirania foi fornecida tardiamente pelo próprio Freud.
Assim, o trabalho do artista implica em uma criação que o permita escapar do olhar Supereu, que, segundo Didier-Weill (2012), teria um efeito petrificante. Para essa empreitada, é necessário que o artista se apodere de outros meios, que lhe forneçam passagens. Por tais razões, o trabalho elaborado pelo artista invoca o retorno a algo de si, insistindo em preservar-se.
Contudo, o olhar medusante do Supereu está presente no próprio sujeito, e escapar de seu próprio olhar exige a mobilização da pulsão de apoderamento, como uma força que possibilite certo distanciamento deste olhar. Podemos elencar algumas ações que expressam a presença do apoderamento no campo da arte: a) a condição de domar o objeto que é usado para criação; b) a fabricação de determinado tipo de expressão, que seja suporte de seu lugar no mundo; e, por último: c) o emprego de uma parte de si que possa ocupar o lugar erógeno para “se fazer” na relação com o outro, que às vezes é a religação com partes de si mesmo.
À medida que a fase adulta se caracteriza pelos imperativos supereuóicos, a elaboração artística passa a ser uma transgressão, criando uma ponte entre o conhecido e o indizível, prolongando os jogos mais primitivos da infância. Em outras palavras, podemos afirmar que a preservação do brincar mais próximo da realidade exige um trabalho psíquico engenhoso, reduzindo a distância entre as duas esferas - uma definição de Freud (1908/2015) para a prática artística.
Ainda sobre os elementos diferenciais do apoderar-se na arte, compreendemos que se trata de preservar a produção sem se fixar rigidamente ao objeto, mas, ao contrário, agarrar-se com flexibilidade aos acessórios, sem colar-se ao outro. Isso possibilita o acesso ao terreno do “não sentido”, caracterizando o estranho no artista, algo que, por vezes, coincide com a prática psicanalítica.
Essas indicações dialogam com o ensino de Lacan (1959-1960/2008), quando ele se refere a alguns elementos conceituais que podemos chamar de “metapsicologia lacaniana”, na qual se interligam conceitos como das Ding, objeto a e o savoir-faire (saber-fazer). Lacan destaca um “fazer” que permite à psique produzir contornos diante das impossibilidades dadas pela realidade. A partir desta compreensão, o “fazer” do artista, embora distinto do de outros indivíduos, também está presente na práxis do psicanalista. Afinal, é preciso prescindir de si, escapar do próprio Supereu para operar a criação. Ação que não pode ser realizada sem que um tipo de assenhoreamento ou apoderamento de algo constitutivo esteja construído. Na mesma linha de investigação da pulsão de apoderamento, Trevisan et al. (2024) enfatizaram as atividades psíquicas de criação e destruição, situadas como ferramentas para elucidar o debate sobre as ações anteriores à dualidade Eros e Thânatos, permitindo discernir as especificidades da potência para apoderamento.
A força para instituir, para forjar as criações substitutivas frente à perda original relacionada com a entrada no mundo forma expressões da pulsão de apoderamento. Ela serve à constituição psíquica na medida em que se trata do ímpeto para lidar com a experimentação radical de contato com o mundo, da qual nenhum humano pode escapar. Assim, a pulsão de apoderamento é uma potência para criação psíquica, para a montagem do aparelho psíquico, antes mesmo da vetorização pulsional no eixo Eros-Pulsão de morte, ainda que, a posteriori, vá servir a ambas. Em uma posição similar, Trevisan et al. (2022b) reinterpretaram a ação do apoderar-se como inerente à criação, seja no controle interno das excitações, seja no enfrentamento da diferença imposta pela realidade, vinculando-a profundamente às condições pulsionais.
A criação do apoderamento: sobre (se) fazer-saber
Avançando a discussão e as ilustrações que sustentam a posição por nós defendida, prossigamos refinando a presente contribuição, estabelecendo um eixo que vincule a criação do campo da arte como coextensiva à do psicanalisar. Ele se dará em torno da função do “se fazer”, sempre levando em consideração as semelhanças e diferenças entre dois registros tão diversos. Dedicaremos atenção especial ao verbo “se fazer”, do qual, assim como Freud, extraímos o acabamento clínico. Freud (1897/1996) registrou um comentário relevante a Fliess quanto a esta expressão:
A palavra “machen” [que significa “fazer”] possibilitou juntar a situação posterior e a situação infantil. As ideias obsessivas, muitas vezes, revestem-se de uma extraordinária imprecisão verbal, a fim de permitir esse emprego múltiplo. A própria palavra “machen” passou por uma transformação análoga ao seu significado. Uma antiga fantasia minha, que eu gostaria de recomendar à sua sagacidade linguística, ocupa-se da derivação de nossos verbos de termos originalmente copro-eróticos como este. (FREUD, 1897/1996, p. 323)
Na carta a Fliess datada de 22 de dezembro de 1897, Freud (1897/1996) enfatizou em uma palavra a possibilidade de reunir diversos significados da prática do analista. A multiplicidade do verbo “machen” comporta valiosos fundamentos, os quais examinaremos adiante. Ainda sobre a breve correspondência, conhecida como “Carta 79”, Freud abordou o termo ao explicar seu caso:
Tomemos como exemplo o seguinte caso: uma menina que frequentou a escola de costura, e que teria terminado imediatamente, se irrita com esta representação obsessiva: “Não, você não deveria ir, você ainda não terminou, você ainda tem que fazer. Além disso, aprenda o máximo possível.” Depois, a lembrança das cenas da infância em que a colocavam no penico, ela não queria ficar ali e sentia a mesma compulsão: “Não pode ir, ainda não acabou, tem que fazer mais.” A palavra “fazer” permite unir a situação posterior com a infantil. As representações obsessivas são muitas vezes revestidas de uma peculiar imprecisão de palavras para permitir esse uso múltiplo. (FREUD, 1897/1996, p. 323)
Embora não seja objeto deste artigo adentrar no terreno da neurose obsessiva, expomos a vinheta de Freud para explicitar o eixo do “fazer” e sua relação com a pulsão de apoderamento, cuja extensão é patente no adoecimento neurótico. O mesmo traço, o do “fazer adoecido”, reapareceu anos mais tarde, para Freud (1914/1996), em “Recordar, repetir e elaborar”. Agora, o “fazer”, “machen”, está referenciado na atuação neurótica que advém em substituição à lembrança recalcada. A ação preserva um não saber sobre aquilo que se faz, a partir de um tipo de posição em que o conteúdo se presentifica em um “fazer”, evidente no caso apresentado acima.
Fortalecemos a análise deste ponto com mais detalhes, propondo examinar o “fazer” do lado do analisando, em paralelo com o seu “atuar”, dado que nele existe uma dimensão bem mais complexa da história do sujeito, com suas saídas pulsionais associadas às representações, manifestas em seus sintomas. Freud (1897/1996, p. 323) inferiu que “a tendência à irrupção utiliza-se de uma palavra que tenha essa espécie de ambiguidades com diversos sentidos, como se estivesse matando várias moscas com um só golpe”. Nessa teorização dos primórdios do pensamento freudiano, pois data de 1897, podemos localizar o gérmen da teoria do significante elaborada por Lacan.
A curiosa expressão de Freud, “matar várias moscas com um golpe só”, abriga um enigma e indica a porta que dará acesso aos trâmites pulsionais. Assim, colocamos a seguinte questão: que atividade é essa, com tamanha potência e amplitude? De partida situamos tal magnitude no nível pulsional, de onde provém a força deste “fazer”.
Antes de esmiuçar tal questão, cabe notar um detalhe especial dessa expressão. A história das moscas tem origem em um conto dos irmãos Grimm, “O pequeno alfaiate valente”, de 1812, do qual Freud era um leitor assíduo. Um trecho da vinheta literária ilustra com mais precisão a complexidade que envolve a atividade psíquica da criação. Trata-se do seguinte: Certa vez, um alfaiate comprou uma geleia da vendedora que anunciava na rua. Em seguida, tirou o pão do armário, passou a geleia e, antes de comer, decidiu terminar um paletó. Para sua surpresa, quando voltou havia muitas moscas sobre o pão, e ele reclamou enxotando as intrusas:
[...] “quem vos convidou? As moscas, porém, que não compreendiam a linguagem dele, não se deixavam enxotar e voltavam sempre em maior número. Por fim, como se costuma dizer, saltou-lhe a mosca ao nariz; então apanhou um pano e zás-trás, sem a menor piedade, foi batendo e gritando. Esperem, que vou mostrar-vos quem sou! Quando parou de bater e retirou o pano, contou não menos de sete moscas que jaziam aí mortas, espichando para o ar as perninhas secas - És tão corajoso assim? - disse, admirando o próprio valor. - É preciso que toda a cidade o saiba. Num abrir e fechar de olhos, o pequeno alfaiate cortou um cinto, costurou-o e bordou nele as seguintes palavras em letras graúdas: “Sete de um só golpe.”. (GRIMM, 1812/1990, p. 275).
Dessa narrativa, extraímos a face da criação que revela a potência da pulsão de apoderamento. Ora as moscas não compreendiam as palavras do alfaiate, assim como a realidade não compreendia a demanda do inconsciente; isso impõe ao sujeito - que neste caso é o alfaiate - produzir uma outra ação, um feito inventivo. Segundo o conto, ele cria uma forma com a qual surpreende a si mesmo, um tipo de invenção: com um único fazer/ato acertou sete moscas. Outro detalhe importante é que, com tal ação, o alfaiate pôde empregar algo de si. Aparece aqui o trabalho psíquico do “se fazer”. Ou seja, na empreitada contra as moscas, a força é empenhada na criação do instrumento do qual o alfaiate pode se servir para preservar seu interesse na relação com mundo, resultando até mesmo na produção de um cinto.
Neste ponto, encontramos uma das pistas que Freud também seguiu: o conceito de “fazer”, que abriga o trabalho da pulsão e, por consequência, a criação. Afinal, o alfaiate toma seu pano e, com força, o dirige às moscas, sem saber ao certo como seria, mas o faz - o que nos faz evocar a noção de “criação” acima articulada.
Retomemos o “fazer” e a pulsão nos termos de Freud, que permite distinguir a atuação neurótica para além da repetição. A força da ação no eixo da criação não repetitiva é o ponto onde Freud entreviu suas raízes no brincar. Ao tratar diretamente da pulsão de apoderamento, é no brincar que Freud (1920/2020, p. 96) situa o surgimento direto dessa força, interpretando-a na brincadeira do Fort-Da: “Esses esforços podem ser atribuídos a uma pulsão de apoderamento que atuava independentemente da lembrança em si mesma ser agradável ou não”. Convém lembrar, aquilo que Garcia-Rosa (2014) destacou com precisão sobre o tema da repetição, ao indicar sua ligação com o trabalho psíquico da criação, situando-a em dois polos: a repetição literal, que se inclina ao páthos, mais do mesmo; e a repetição que introduz um ensaio para preservar a alteridade interpretativa da realidade, ou seja, a repetição que permite ao sujeito viver sua diferença em relação ao outro.
Indo no mesmo sentido deste raciocínio, abordamos o “fazer” em duas vertentes da criação: uma, no caso de Freud, o “fazer” que gera repetição, o sintoma; e a outra, o “fazer” que cria condições para operar no mundo, independente do registro anterior. A contribuição original nesta linha é vincular o desejo de criação à pulsão de apoderamento, visível tanto no feito do alfaiate dos irmãos Grimm, quanto na brincadeira do Fort-Da.
Podemos avançar aqui sobre o postulado de Lacan sobre o “fazer”, o que nos permite enriquecer nosso posicionamento sobre a pulsão de apoderamento. Lacan (1964/2008) retomou os momentos lógicos do surgimento do sujeito a partir das primeiras experiências no mundo, situando a criação como condição fundamental para o surgimento do ser humano.
Para a teoria psicanalítica, o trabalho de “se fazer” é inerente a qualquer arte desde as origens do sujeito. Lacan (1964/2008) atestou a atividade da pulsão, sem nomear propriamente uma categoria, mas enfatizou o “se fazer” no eixo do terceiro tempo pulsional, cujo circuito dará lugar ao advir do sujeito do inconsciente. Do “se fazer” ao “fazer de Si” ocorre uma fabricação particular de cada sujeito, pois coloca em suspenso o saber em detrimento da criação, haja vista que a criação envolve o desconhecido. Tomando as coisas desta perspectiva, o impulso do apoderamento comparece em um eixo bastante originário e arcaico da psique, tendo como objetivo o advir do Eu.
A partir disso, na práxis clínica, observamos dois aspectos. De um lado, o a posteriori como efeito do tratamento psicanalítico, que possibilita ao sujeito o acesso a um saber revelado pelas vias da criação, ainda que inicialmente por meio do sintoma, até o trabalho de criação para instalar outros saberes de si e do mundo. A lógica aqui remete diretamente ao postulado de Lacan (1975-1976/2007) sobre o savoir-faire, que está ligado às dinâmicas manifestas nos sintomas.
Por outro lado, temos o trabalho a priori do psicanalista, cuja condição peculiar implica em um “criar” para só-depois, em uma aposta, permitir a construção do saber-fazer. Em síntese, esta criação por parte do analista está indiscutivelmente relacionada com o trabalho de “fazer-saber”, condição singular que revela a ordem do intransmissível presente na própria formação do psicanalista. O fundamento deste “fazer-saber” só é instrumentalizado pelos poderes da transferência, ou seja, o analista, assim como o artista, emprega uma criação que objetiva um “fazer”, “fazer surgir”, sem o qual não se pode haver uma psicanálise e muito menos um contato com inconsciente. Em síntese, do lado do analista, o princípio do tratamento reside na criação para o “fazer-saber” da manifestação do inconsciente, ao passo que, na posição do analisando a maior consequência efetivada pela criação, produzirá singularmente, o “saber-fazer”.
Em seu ensino, Lacan (1964/2008; 1975-1976/2007) forneceu coordenadas sobre a ação inicial da pulsão, no sentido de uma ânsia que visa ligar-se. Assim, manifesta-se o “fazer” no campo da linguagem, em que, do lado do analisando, emerge a solicitação “o que fazer?” e, do analista, em seus vários estilos, responde um “faça palavra”. A criação circula efetivando um “fazer” paradoxal, como uma força que aciona o jogo inerente às pulsões e o modo como elas aparecem nas representações.
Lacan (1959-1960/2008) supôs que há na pulsão uma força historicizadora, ou seja, uma força que cria o ponto de partida do seu percurso. Esse empenho está ligado ao eixo da criação, que exige da relação com o mundo um produto/objeto, aparecendo na clínica tanto nos sintomas de adoecimento, representados pela compulsão à repetição, quanto nas invenções criativas do sujeito.
Sob tal perspectiva, situamos a ação da pulsão de apoderamento em seu ímpeto como algo que pode ser provocado pelo “fazer” do psicanalista, tendo como produto os relampejos materiais do inconsciente, de modo a possibilitar o percurso das travessias do “fazer-saber” ao “saber-fazer”. Podemos dividir o ato da criação em dois subgrupos. O primeiro envolve a repetição compulsiva, uma reprodução do modelo relacional derivado das formações do Édipo, dos mitos e das contingências que o sujeito forjou. O segundo trata da repetição que se inclina à inclusão da experiência, sobretudo naquilo que ela comporta de alteridade, da imprevisibilidade da vida, ou a imposição que a realidade exerce sobre o aparelho psíquico. A manifestação da criação em suas duas versões foi expressa pelo poeta Manoel de Barros (2016, p. 115): “repetir, repetir, até ficar diferente”.
Freud retomou essa questão ao definir a repetição patológica e compará-la ao jogo do Fort-Da, uma condição não patológica. Nesse ponto de sua obra, o conceito de apoderamento se torna mais evidente. É curioso que isso não tenha chamado a atenção dos psicanalistas lacanianos. A pulsão de apoderamento no caso do Fort-Da implica uma criação particular: não se trata da criação do mundo, mas de uma criação de si mesmo a partir da extração do mundo. A originalidade da pulsão de apoderamento reside, então, nessa especificidade, de que decorre o surgimento do Eu (FREUD, 1920/2020, TREVISAN, 2021, TREVISAN et al. 2023).
A clínica psicanalítica testemunha esta condição em que o adoecimento neurótico coloca em jogo o aprisionamento na busca da satisfação direta, limitando a possibilidade de o sujeito criar um “saber-fazer”. A compulsão à repetição concorre para um tipo de psicopatologia da criação, encerrando o sujeito na mesmidade fantasmática ou endereçando-o à uma miragem de sua realidade que, quanto mais se aproxima, mais se dissolve, a fim da manutenção do “circuito da compulsão”. O tratamento clínico nos permite ver e escutar seus retornos, ou seja, como os objetos da vida se tornam o aparato para encenar o jogo da presença e da ausência, que a existência insiste em impor.
PARA CONCLUIR
Este artigo evidencia os impactos da reavaliação da pulsão de apoderamento, sublinhando que o “fazer”, presente tanto na arte quanto na práxis psicanalítica, constitui um ponto de interseção entre ambos. Como consequência dessa releitura, a discussão acrescenta elementos para a aproximação do trabalho de criação artística como manifestação da potência da pulsão de apoderamento, tanto no trabalho do psicanalista quanto na atividade do artista.
Esse resgate permitiu ampliar a compreensão da força em questão em seus termos conceituais, destacando as expressões metapsicológicas do apoderamento como distintas de outras categorias pulsionais. Por fim, sublinhamos as semelhanças e diferenças da ação criativa dessa pulsão no brincar, especialmente no campo da arte e da clínica, para ilustrar na prática as manifestações comuns a ambos os campos. Para concluir, indicamos que a criação pulsional se manifesta em duas vertentes: uma que reduz as posições do sujeito na cultura, culminando naquilo que é conhecido como a produção dos sintomas, na forma adoecida da repetição neurótica; e outra que se expressa na criação propriamente dita, na insistência rumo à reinvenção, ilustrando a presença da pulsão manifesta no sujeito a partir das tramas da psicopatologia freudiana.
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Authorship
Antonio Trevisan
Doutor em Psicologia Clínica e Cultura da Universidade de Brasília (UnB) Brasília/DF, Brasil, e pela Université Côte d’Azur - UCA. Nice, França
Universidade de Brasília(UnB) Brasília/DF, BrasilUniversidade de BrasíliaBrazilBrasília, DF, BrazilUniversidade de Brasília(UnB) Brasília/DF, Brasil
Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJInstituto de Psicologia UFRJ, Campus Praia Vermelha, Av. Pasteur, 250 - Pavilhão Nilton Campos - Urca, 22290-240 Rio de Janeiro RJ -
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