Resumo
Objetivo: Desenvolver e analisar as evidências de validade de conteúdo de uma intervenção de enfermagem denominada Ultrassonografia da Veia Cava Inferior.
Métodos: Estudo metodológico dividido em duas fases: na primeira, foi realizada revisão narrativa de literatura de estudos publicados nos cinco anos anteriores, visando ao desenvolvimento de uma nova intervenção de enfermagem baseada nas recomendações da Classificação das Intervenções de Enfermagem. A segunda fase consistiu na análise das evidências de validade de conteúdo da intervenção de enfermagem, por especialistas na temática, em relação à clareza, relevância teórica e pertinência prática, sendo calculada a Razão de Validade de Conteúdo (CVR).
Resultados: Identificaram-se 21 estudos que abordaram o local da avaliação da veia cava inferior, bem como o tipo de transdutor, posição do paciente e a forma do cálculo da distensibilidade da veia cava inferior, os quais nortearam a construção da intervenção de enfermagem Ultrassonografia: Veia Cava Inferior. Foram necessárias três rodadas de avaliação para o alcance da CVR crítica e a intervenção final ficou composta de 19 atividades e uma definição, com tempo médio para realização de cinco minutos.
Conclusão: a intervenção de enfermagem foi desenvolvida com base nos artigos publicados nos cinco anos prévios e apresentou adequadas evidências de validade de conteúdo. A intervenção poderá ser aplicada na prática clínica assistencial e ser utilizada tanto no ensino como na pesquisa em enfermagem.
Descritores
Ultrassonografia; Veia cava inferior; Terminologia padronizada em enfermagem; Estudos de validação
Abstract
Objective: To develop and analyze evidence of content validity of a nursing intervention called Inferior Vena Cava Ultrasound.
Methods: This is a methodological study divided into two phases: in the first, a narrative literature review of studies published in the previous five years was carried out, aiming to develop a new nursing intervention based on the Nursing Interventions Classification recommendations. The second phase consisted of analyzing evidence of content validity of the nursing intervention by experts on the subject in relation to clarity, theoretical relevance and practical relevance, calculating the Content Validity Ratio (CVR).
Results: Twenty-one studies were identified that addressed the inferior vena cava assessment site as well as the type of transducer, patient position and how inferior vena cava distensibility was calculated, which guided the construction of the nursing intervention Ultrasound: Inferior Vena Cava. Three rounds of assessment were necessary to achieve critical CVR, and the final intervention was made up of 19 activities and a definition, with an average time to complete it of five minutes.
Conclusion: The nursing intervention was developed based on articles published in the previous five years and presented adequate evidence of content validity. The intervention can be applied in clinical care practice and be used both in nursing teaching and research.
Resumen
Objetivo: Desarrollar y analizar evidencias de validez de contenido de una intervención de enfermería llamada ecografía de la vena cava inferior.
Métodos: Estudio metodológico dividido en dos fases: en la primera, se realizó una revisión narrativa de la literatura de estudios publicados en los últimos cinco años, para desarrollar una nueva intervención de enfermería basada en las recomendaciones de la Clasificación de las Intervenciones de Enfermería. La segunda fase consistió en el análisis de las evidencias de validez de contenido de la intervención de enfermería por parte de especialistas en el tema, con relación a la claridad, relevancia teórica y pertinencia práctica, y se calculó la Razón de Validez de Contenido (CVR, por sus siglas en inglés).
Resultados: Se identificaron 21 estudios que abordaron el local de evaluación de la vena cava inferior, así como el tipo de transductor, la posición del paciente y la forma del cálculo de distensibilidad de la vena cava inferior, que orientan la construcción de la intervención de enfermería: ecografía de la vena cava inferior. Fueron necesarias tres rondas de evaluación para alcanzar la CVR crítica, y la intervención final quedó compuesta por 19 actividades y una definición, con tiempo promedio de realización de cinco minutos.
Conclusion: La intervención de enfermería se desarrolló basada en los artículos publicados en los últimos cinco años y presentó evidencias de validez de contenido adecuadas. La intervención podrá aplicarse en la práctica clínica asistencial y utilizarse tanto para la enseñanza, como para la investigación de enfermería.
Descriptores
Ultrasonografía; Vena cava inferior; Terminología normalizada de enfermería; Estudio de validación
Introdução
É notório o interesse em práticas capazes de inovar e reformar sistemas de saúde, em especial, práticas que melhorem a segurança do paciente frente às intervenções dos profissionais de saúde. A enfermagem de Prática Avançada (EPA) é atualmente considerada uma dessas inovações, a qual deve integrar pesquisa, educação, prática assistencial e gestão, proporcionando um alto grau de autonomia profissional e competência na tomada de decisões, incluindo responsabilidades na gestão de casos clínicos, como avaliação, implementação e análise de resultados.(1) Em todo o mundo, o avanço na adoção de práticas com recursos tecnológicos visa a aumentar a segurança na realização de procedimentos. Nesse sentido, a utilização da ultrassonografia (USG) pelos enfermeiros representa um dos avanços significativos na assistência prestada aos pacientes em todos os níveis de atenção.
A USG possibilita a realização de vários procedimentos à beira-leito, bem como contribui para o aprimoramento da avaliação clínica pelo enfermeiro, como o quinto pilar da propedêutica. Por meio da portabilidade dos equipamentos atuais, associada ao treinamento da equipe, sua implementação confere diminuição de complicações, assim como a promoção da segurança aos pacientes.(2)
No ano de 2021, o Conselho Federal de Enfermagem aprovou uma resolução de número 679, que confere ao enfermeiro a realização da ultrassonografia sem fins nosológicos, sendo esta ação privativa do enfermeiro, no âmbito da equipe de enfermagem. (3) Diversos são os procedimentos de enfermagem que podem ser facilitados, ou mesmo confirmados, com o uso da USG, tais como: punção venosa periférica, passagem de cateter central de inserção periférica e confirmação do posicionamento de cateter enteral de curto prazo, avaliação do volume residual gástrico antes da infusão da dieta enteral e da indução anestésica, avaliação do volume residual de urina na bexiga e avaliação volêmica, por meio do grau de colapsabilidade da veia cava inferior (VCI).(4, 5)
A avaliação da VCI por meio da USG permite a apreciação do estado volêmico do paciente, da pressão venosa central (PVC) de forma indireta, da responsividade a fluidoterapia e do nível da pré carga do ventrículo direito. A avaliação da VCI, tanto para monitorização do diâmetro e da colapsabilidade, pode ser realizada pela janela subcostal, com o transdutor convexo ou setorial nos modos Brilho (modo B) ou Motion (modo M), com o paciente em posição supina. Um diâmetro da VCI inferior a 2,1 cm e uma colapsabilidade superior a 50% indicam uma PVC normal. Já um diâmetro da VCI superior a 2,1 cm com colapsabilidade inferior a 50%, indica um valor elevado de PVC. Os cenários intermediários, nos quais o diâmetro da VCI e a colapsabilidade estão em valores intermediários, correspondem a uma faixa intermediária de pressão de 8 mmHg (5-10 mmHg).(6) Na figura 1, destaca-se a avaliação da VCI pela USG, tanto no modo B como no modo M.
Avaliação da veia cava inferior no modo B (à esquerda) e modo M (à direita) pela ultrassonografia
A avaliação da VCI e do seu grau de colapsa-bilidade (pacientes em ventilação espontânea) ou distensibilidade (pacientes sob ventilação mecânica) é um importante avanço na prática clínica do enfermeiro, pois pode facilitar a identificação de diagnósticos de enfermagem com maior acurácia, de maneira mais assertiva, a propositura das intervenções de enfermagem como orientação para o controle hídrico, encaminhamento ao serviço de emergência, monitorização hemodinâmica, controle de energia e cuidados de higiene e conforto.(7)
Esta avaliação, como parte integral do exame físico conduzido pelo enfermeiro, pode ser implementada em diversos contextos do cuidado ao paciente. Estes contextos incluem: atendimento pré-hospitalar, para avaliar possíveis sangramentos; atendimento ambulatorial, especialmente em pacientes com risco de desequilíbrio no volume de líquidos, como aqueles com insuficiência cardíaca ou em tratamento dialítico; situações de pré ou pós-operatório, nas quais há risco de sangramento ou perda volêmica; serviços de emergência ou unidades de terapia intensiva, para avaliar o estado hemodinâmico e circulatório.(5, 6, 8, 9, 10)
Diante do exposto, os pesquisadores deste estudo procuraram determinar se a USG da VCI estava incluída na Classificação das Intervenções de Enfermagem (NIC), desenvolvida pela Universidade de Iowa.(8) No entanto, não foi encontrada nenhuma intervenção relacionada a este procedimento específico. Devido à natureza recente da incorporação da USG da VCI à prática clínica dos enfermeiros, há uma carência de estudos, tanto nacional quanto internacionalmente, que abordem a realização desta avaliação por enfermeiros. Portanto, este estudo foi concebido com o propósito de preencher essa lacuna, visando desenvolver e analisar as evidências de validade de conteúdo de uma intervenção de enfermagem denominada Ultrassonografia da Veia Cava Inferior.
Métodos
Trata-se de um estudo metodológico realizado em duas fases: na primeira, foi realizada uma revisão narrativa de literatura com foco na identificação dos passos para a realização da USG para avaliação do diâmetro e da distensibilidade da VCI para a construção das atividades da intervenção. A segunda fase consistiu na análise das evidências de validade de conteúdo da intervenção proposta.
A avaliação dos estudos para esta revisão foi norteada pelo mnemônico SPIDER, sendo Sample (Amostra): pacientes adultos; Phenomenon of Interest (Fenômeno de interesse): realização da USG do diâmetro e distensibilidade da VCI; Design (Desenho do estudo): estudos transversais, longitudinais ou estudos experimentais; Evaluation (Avaliações): passos para a realização da USG; Research type (Tipo de pesquisa): estudos quantitativos e/ou qualitativos.
A busca na literatura e seleção de dados para a pesquisa foi realizada na BVS - Biblioteca Virtual em Saúde e no Pubmed (National Library of Medicine). Foram incluídos nesta revisão os estudos que descreveram os passos operacionais para a realização da USG para avaliação do diâmetro e distensibilidade da VCI no período de 2019 a 2023 nos idiomas inglês e português.
As estratégias de buscas foram definidas e documentadas por meio dos descritores Medical Subject Headings (MeSH) e Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) descritos abaixo:
Busca 1 | ((ULTRASONOGRAPHY[Title/Abstract]) OR (ULTRASOUND[Title/Abstract])) AND (VENA CAVA INFERIOR[Title/Abstract]) |
Busca 2 | ultrassonografia) AND (veia cava inferior) AND (volume status) AND ( la:(“en” OR “es” OR “pt”) AND limit:(“female” OR “male” OR “middle aged” OR “adult” OR “aged”)) AND (year_cluster:[2019 TO 2023]) |
Inicialmente, dois pesquisadores avaliaram os estudos quanto à elegibilidade, por meio da leitura do título e do resumo e, após a seleção dos artigos, os pesquisadores extraíram conjuntamente as seguintes informações: título, ano, objetivo, método e passos utilizados para a realização da intervenção em questão, por meio de um quadro realizado para este fim. Tanto a seleção dos artigos quanto a extração das informações foram realizadas por dois pesquisadores, ao mesmo tempo, em reuniões presenciais.
Diante dos passos identificados na literatura, foram desenvolvidos o título da intervenção, a definição e as atividades, baseando-se nas orientações da NIC em relação à proposta de novas intervenções.(7) Após a construção da intervenção de enfermagem, ela foi submetida à avaliação do conteúdo por especialistas com as seguintes características: ser profissional da área da saúde (médicos, enfermeiros ou fisioterapeutas) com titulação mínima de especialistas, com experiência clínica e/ou em ensino na área de USG de VCI.
Os especialistas elegíveis foram selecionados pela técnica de amostragem bola de neve, com o primeiro estrato gerado intencionalmente a partir dos pesquisadores. Foi enviado o convite à participação no estudo por e-mail com o link para o Google Forms, juntamente com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, ficha de caracterização do especialista e o instrumento para avaliação da intervenção.
Os especialistas avaliaram a intervenção quanto a clareza, relevância teórica e pertinência prática, incluindo o título da intervenção, a definição e as atividades, por meio de uma escala dicotômica, sendo 1 concordo e 2 não concordo, com espaço para sugestão para cada item avaliado.
Para cada indicador, foi calculada a razão de validade de conteúdo (CVR) proposta por Lawshe em 1975. A CVR foi calculada da seguinte maneira: em que ne significa o número de especialistas que concordaram com o item e N o número total de especialista.(11) O valor crítico estabelecido para a primeira rodada foi de 0,53 (p=0,04) considerando a devolutiva de 10 especialistas; para a segunda rodada, a CVR crítica foi de 0,75 (p=0,03) baseando-se no retorno da resposta de oito especialistas e, para a terceira rodada, a CVR crítica foi de 1,0 (p< 0,01), com a entrega de sete especialistas.(11)
Esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade, aprovada sob o número 5.721.280 (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética: 61275922.3.0000.5505) e obedeceu a todos os preceitos éticos e legais.
Resultados
Na primeira etapa, foram selecionados 21 estudos que relataram, de forma descritiva, a realização da USG da VCI, sendo excluídos os artigos que envolviam crianças, com ausência de relato da técnica de insonação da VCI, estudos relacionados ao desenvolvimento de software de inteligência artificial para a medição da VCI, estudos que não incluíram adultos na avaliação e artigos de revisão.
Dos 21 estudos incluídos(12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31) na revisão, a maioria foi publicada em 2019 e envolveu a avaliação volêmica por meio da USG da VCI em pacientes com doença renal em terapia dialítica,(17, 18, 20, 26) insuficiência cardíaca,(22, 28, 31) hospitalizados com cuidados intensivos(14, 23, 25) e com sangramento em diversas situações, como pós-operatório de cirurgia de quadril,(15) vascular,(29) em mulheres no período pós-parto(27, 32) e em situações de emergência.(19) Também foram identificados estudos que avaliaram o status volêmico em indivíduos saudáveis.(21) O processo de seleção dos estudos encontra-se na figura 2. No quadro 1, encontram os principais achados.
Artigos incluídos na revisão narrativa de literatura sobre os passos empregados na realização da ultrassonografia da veia cava inferior
Com base na revisão narrativa de literatura, foi construída a primeira versão da intervenção de enfermagem contendo 28 atividades para sua realização com o título denominado “Ultrassonografia: Veia Cava Inferior, com a seguinte definição: Realização da Ultrassonografia para a avaliação do diâmetro e da variabilidade da veia cava inferior em pacientes adultos, para estimar o valor da pressão venosa central e da avaliação volêmica. Esta proposta de intervenção de enfermagem foi enviada para 16 profissionais de saúde (médicos, enfermeiros e fisioterapeutas), com experiência na utilização da USG point of care, com devolutiva de 10 profissionais. A maioria dos profissionais eram do sexo feminino, enfermeiros, com média de idade de 35 anos, 90% com titulação de mestrado, 80% com experiência no sistema de linguagem padronizada com média de nove anos e 100% com experiência em USG, com tempo médio de cinco anos, conforme tabela 1.
Na primeira rodada de avaliaçãoo, foi sugerida a exclusão de certas atividades, por não serem específicas para a tarefa ou por serem consideradas rotineiras na instituição, como a organização de materiais e tabelas de medição da VCI. Além disso, foi recomendado o agrupamento de atividades relacionadas ao ajuste da profundidade, brilho e frequência do aparelho, resultando na identificação de cinco atividades com CVR inferior a 0,75. Os apontamentos foram reorganizados e novamente encaminhados ao grupo de especialistas para uma nova rodada de avaliação com 19 atividades.
Algumas sugestões foram feitas pelos especialistas em relação à descrição da atividade, conforme sugestão da NIC, ou seja, substituição da expressão “caso possível” para “conforme apropriado”, resumo da técnica para mensuração da VCI para evitar descrição extensa em uma única atividade e a forma da descrição da indicação da mensuração da VCI. Na análise da concordância, quatro atividades tiveram CVR inferior a 1,0 conforme a avaliação de oito especialistas. As sugestões fornecidas pelos especialistas foram prontamente incorporadas pelos pesquisadores. Após as devidas modificações, o documento foi reenviado para a terceira rodada de avaliação aos especialistas, com CVR igual a 1,0 em todas as atividades, bem como o título e a definição. O quadro 2 apresenta a versão final da intervenção.
Discussão
A incorporação de novas tecnologias à prática clínica assistencial do enfermeiro requer que novas intervenções de enfermagem sejam desenvolvidas e submetidas a avaliação quanto aos diversos níveis de evidências de validade. Neste contexto, este estudo desenvolveu uma nova intervenção de enfermagem para a realização da USG da VCI para mensuração do estado volêmico do paciente.
A avaliação do estado volêmico nos pacientes hospitalizados em diversos cenários, tais como unidades hospitalares de emergência, terapia intensiva, de internação com cuidados mínimos e intermediários e também em pacientes atendidos em ambientes ambulatoriais, é uma preocupação constante, principalmente em situações críticas, que demandam um olhar minucioso e especializado do enfermeiro.(12, 13, 15, 17, 18, 19, 26, 29, 31) Portanto, a USG da VCI é uma ferramenta adicional ao enfermeiro para a identificação desses fenômenos, permitindo uma avaliação com maior acurácia.(5)
Inicialmente, a definição da intervenção de enfermagem foi desenvolvida com base nas diretrizes da NIC, e teve por objetivo descrever a finalidade da USG da VCI. A totalidade dos estudos incluídos na revisão narrativa de literatura descreveram a avaliação do diâmetro e da colapsabilidade da VCI como o propósito principal da USG,(12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32) tanto para avaliação do estado volêmico,(17, 19, 20, 22, 26, 28) como para predizer síncopes(29) e mesmo antever hipotensão arterial após exames como colonoscopia.(12)
As atividades incluídas nesta intervenção de enfermagem estiveram relacionadas à prática da segurança do paciente(33) e controle de infecção hospitalar, como a identificação correta do paciente, colocação dos equipamentos de proteção individual, assim como as prerrogativas legais relacionadas aos registros das ações de enfermagem.(33)
Foi incluída uma atividade relacionada à escolha correta do transdutor, uma vez que cada tipo de transdutor para a realização da USG apresenta uma frequência de ondas sonoras e consequente penetrabilidade nos tecidos e resolução das imagens. Portanto, com base nas recomendações dos estudos foi sugerida a escolha do transdutor convexo(13, 14, 16, 17, 18, 19, 20, 26, 29, 32) ou setorial,(24, 25) por apresentarem um nível adequado de penetrabilidade nos tecidos, capaz de gerar adequada imagem para mensuração VCI.
Outra atividade incluída na intervenção foi o posicionamento do paciente durante a realização da USG. Na maioria dos estudos realizou-se a aferição do diâmetro da VCI em pacientes em posição supina, com inclinação da cabeceira até 30 graus.(13, 14, 16, 19, 20, 26, 27) Em um estudo desenvolvido com 95 pacientes hospitalizados em uma terapia intensiva, houve diferença significativa do diâmetro da VCI quando comparado os decúbitos de 0º com o decúbito de 45º e entre 30º com 45º, sem diferença estatística com os decúbitos de 0º a 30º.(23)
O local de aquisição da imagem ultrassonográfica da VCI em janela subxifóide ou subcostal, com o indicador do transdutor voltado para a cabeça do paciente inicialmente no modo bidimensional (modo B) e posteriormente no modo M, foi baseado na maioria dos estudos incluídos, bem como a aferição dos diâmetros inspiratórios e expiratórios, mensurados a 2 cm da entrada do átrio direito perpendicular à veia hepática.(12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32)
Em relação ao cálculo da variabilidade da VCI, grande parte dos estudos avaliou, como método de estimar o estado volêmico, o cálculo de colapsabilidade da VCI, por meio da subtração do diâmetro máximo pelo mínimo dividido pelo diâmetro máximo,(12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32) porém foi optado em manter a atividade apenas como calcular o grau de variabilidade da VCI, uma vez que existem outras medidas que podem ser realizadas, tais como o cálculo de responsividade de fluidos, e também para manter as recomendações da NIC para a descrição das atividades.
Após o desenvolvimento da nova intervenção de enfermagem, ela foi submetida a análise das evidências de validade de conteúdo, que se refere ao quão relevantes e representativos são os itens do instrumento.(34, 35) A intervenção foi analisada por um grupo de especialistas com notória experiência no uso da USG e em sistema de linguagem padronizada de enfermagem. Este perfil de especialistas está condizente com as diversas recomendações atuais em relação à análise das evidências de validade de conteúdo.(34, 35)
Foi optado, neste estudo, pelo cálculo da CVR como análise de concordância entre os juízes, ao invés da escolha do índice de Validade de Conteúdo, por ser um cálculo que reduz o risco de viés de resposta e hiperinsuflação da concordância,(11, 34, 35) tendo alcançado CVR crítica após a terceira rodada de avaliação. A intervenção foi aplicada a cinco pacientes, com baixo tempo para sua realização, demonstrando ser factível sua realização pelos enfermeiros.
A intervenção de enfermagem validada quanto ao seu conteúdo neste estudo poderá ser utilizada como um protocolo operacional para guiar o enfermeiro na realização desta intervenção, bem como poderá ser utilizado no ensino e em pesquisas, visando a utilizar os dados obtidos, nesta USG, como subsídios para a identificação de fenômenos tratáveis por ações de enfermagem.
Foi considerado como uma limitação deste estudo o tipo de revisão de literatura realizada, uma vez que a revisão narrativa de literatura, por não apresentar uma metodologia sistemática de busca das evidências, pode levar a um viés de seleção dos artigos. Outra limitação identificada foi o tempo médio para a realização da intervenção, uma vez que esta intervenção foi realizada por um pesquisador com experiência, podendo o tempo ser diferente quando realizado por um profissional com menor tempo de treinamento e experiência.
Conclusão
As evidências identificadas possibilitaram a construção da intervenção de enfermagem Ultrassonografia: Veia Cava Inferior, com 19 atividades e tempo médio de cinco minutos de realização, tendo alcançado adequadas evidências de validade de conteúdo na avaliação dos especialistas. Esta intervenção poderá ser utilizada pelos enfermeiros na avaliação do equilíbrio hídrico e na identificação de causas de instabilidade hemodinâmica em diversos cenários de atuação do enfermeiro.
Agradecimentos
Projeto com financiamento do CNPq, Chamada CNPq/MCTI/FNDCT Nº 18/2021 - Faixa A – Grupos Emergentes, processo 403285/2021-6.
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Editado por
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Editor Associado
Thiago da Silva Domingos (https://orcid.org/0000-0002-1421-7468), Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
28 Mar 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
22 Nov 2023 -
Aceito
25 Jun 2024