Resumo
O setor da construção civil pode impulsionar a economia e atrair recursos financeiros, mas deve-se considerar os impactos ambientais e melhorar os processos construtivos com materiais alternativos, como os biocompósitos feitos de fibras naturais, a exemplo da implementação de sisal em argamassa. Este trabalho tem como objetivo avaliar o desempenho mecânico das fibras de sisal em compósito cimentício argamassado. Para isso, utilizou-se fibras com comprimentos de 20 mm e 30 mm, em adições em relação ao volume de cimento de 0,5% e 1,0%, e, por não haver norma específica para caracterizar o sisal, utilizou-se as de fibras de madeira adaptadas. Fez-se também a análise estatística e microscopia eletrônica de varredura (MEV) em corpos de prova. Obteve-se: massa específica real e massa específica aparente do sisal de 1.440,00 kg/m³ e 525,33 kg/m³ respectivamente, teor de umidade de 5,58%, absorção de água de 150,85% em 72h. Nos ensaios mecânicos, as fibras de 20 mm adicionadas em 0,5% aumentaram a resistência das amostras em 12,78% à compressão e 6,84% à tração na flexão nas primeiras idades. Em estudo estatístico, verificou-se a homogeneidade de tais traços e em MEV nota-se maior coesão nas amostras com fibras adicionadas em 0,5% comparada às em 1%.
Palavras-chave
Fibras naturais na construção civil; Sisal em argamassa; Aumento de resistência à compressão e tração; Sustentabilidade
Abstract
The civil construction sector can drive the economy and attract financial resources, but environmental impacts should be considered and construction processes improved with alternative materials, such as biocomposites made from natural fibers, for example, the implementation of sisal in mortar. This work aims to evaluate the mechanical performance of sisal fibers in cementitious composite mortar. For this, fibers with lengths of 20 mm and 30 mm were used, with additions relative to the cement volume of 0.5% and 1.0%. Since there is no specific standard to characterize sisal, wood fiber standards were used instead. Statistical analysis and scanning electron microscopy (SEM) were also performed on test specimens. The following results were obtained: real specific mass and apparent specific mass of sisal were 1,440.00 kg/m³ and 525.33 kg/m³ respectively, moisture content was 5.58%, and water absorption was 150.85% in 72 hours. In the mechanical tests, the addition of 20 mm fibers at 0.5% increased the strength of the samples by 12.78% in compression and 6.84% in flexural tensile strength at early ages. In a statistical study, the homogeneity of these features was verified, and in SEM, greater cohesion was observed in samples with fibers added at 0.5% compared to those at 1%.
Keywords
Natural fibers in construction; Sisal in mortar; Increased compressive and tensile strength; Sustainability
Introdução
A indústria da construção civil tem o poder de impulsionar a economia e atrair investimentos, trazendo benefícios para toda a sociedade. No entanto, é importante considerar os impactos ambientais e buscar maneiras de melhorar os processos construtivos, tanto na execução quanto no uso de materiais alternativos (Dias et al., 2021). Segundo a Associação Brasileira para Reciclagem de Resíduos da Construção Civil e Demolição – ABRECON, a massa total de resíduos da construção e demolição gerada, em 2022, foi de aproximadamente 120 milhões de toneladas (Torres, 2023). Desse modo, é importante adotar um planejamento adequado para evitar perdas de materiais, prejuízos financeiros e danos ambientais. Priorizar o uso correto dos materiais é uma alternativa sustentável que reduz a necessidade de recursos utilizados na produção de outras misturas à base de cimento (Gomes et al., 2021).
Os materiais compósitos são uma combinação de diferentes componentes que se unem para formar um material completamente novo, com propriedades mecânicas aprimoradas, como nos biocompósitos, os quais possuem uma parte de origem natural, como por exemplo, fibras naturais inseridas em matriz cimentícia. As fibras naturais estão se tornando cada vez mais populares devido às suas vantagens, como custo acessível, alta rigidez e disponibilidade em todo o mundo (Ahmad et al., 2022). Existem diferentes tipos de fibras que podem ser adicionadas aos materiais, como de escala nano, micro e macro, artificiais ou naturais. Optar por fibras naturais oferece várias vantagens, como baixo custo, alta resistência, flexibilidade, extensibilidade, elasticidade e sustentabilidade ambiental.
No Brasil, o sisal obtido das folhas da planta Agave Sisalana se destaca como uma fibra natural versátil devido à sua facilidade de cultivo (Iniya; Nirmalkumar, 2021), principalmente no sertão do nordeste, em regiões semiáridas, devido à sua capacidade de se adaptar a climas secos (Francklin et al., 2019). Tal fibra, possui células alongadas, parede celular espessa com celulose, hemicelulose e lignina, responsáveis por oferecer rigidez, armazenamento de água, nutrientes e impermeabilizar a estrutura das fibras (Dias et al., 2021).
No cenário da busca por novos materiais mais resistentes e sustentáveis, surgiram estudos sobre a implementação da fibra natural de sisal em argamassa da construção civil. Segundo pesquisa, com a adição de 0,1% a 2% de fibra em relação ao volume de cimento e comprimento de 50 mm a 60 mm, houve maior ductilidade na fratura das amostras (Iniya; Nirmalkumar, 2021). Além disso, outro estudo fez o uso de fibras curtas de sisal na argamassa do concreto, no comprimento de 40 mm, que demonstrou potencial para superar problemas como falhas abruptas e absorção limitada de energia durante o escoamento (Ahmad et al., 2022). Ainda, a adição de fibras de sisal em compósito cimentício argamassado resultou em melhorias na resistência à tração de 96,37% logo aos sete primeiros dias, quando comparado à mistura de referência, também atuaram como mecanismo de ponte, impedindo a propagação de fissuras. A proporção e comprimento são importantes para o desempenho das argamassas, sendo que um teor de até 0,4% em relação ao volume do cimento mostrou-se satisfatório, sem comprometer a resistência à compressão (Dias et al., 2021).
Percebe-se, dessa forma, um crescente interesse em explorar o uso de fibras naturais, devido às suas propriedades mecânicas satisfatórias e sustentáveis. Nesse contexto, o presente estudo tem como objetivo analisar os efeitos da incorporação das fibras naturais de sisal em compósito cimentício argamassado, visando obter aumento de resistência mecânica em argamassa que requer essa solicitação, como as empregadas em revestimentos de fachadas, pisos e reparos estruturais, de modo a promover práticas sustentáveis que permitam a redução dos impactos ambientais negativos e a fomentação de geração de renda em regiões semiáridas do Brasil.
Método
No presente estudo, foram analisados a areia, o cimento e a fibra de sisal como material alternativo em questão. Sendo a areia e o cimento disponibilizados por uma indústria de concreto em Umuarama – PR, a fibra de sisal foi disponibilizada por uma empresa localizada em Maringá – PR. Os procedimentos experimentais foram feitos no Laboratório de Geotecnia e Materiais, no campus regional de Umuarama da Universidade Estadual de Maringá. Realizou-se a caracterização dos materiais, para então produzir os corpos de prova e analisar sua resistência mecânica. Em seguida, realizou-se a análise estatística e por último, fez-se o estudo microscópico por meio dos fragmentos dos corpos de prova na Central de Microscopia Eletrônica da Universidade Federal do Paraná, campus regional de Palotina – PR.
Caracterização dos materiais
Os materiais foram escolhidos com base na disponibilidade da região. Para caracterizá-los, fez-se ensaios em laboratório e obteve-se dados fornecidos pelo fabricante.
Agregado miúdo
As características físicas do agregado miúdo foram avaliadas conforme as normas listadas no Quadro 1.
Segundo a NBR 7211 (ABNT, 2022a) agregado miúdo é definido como um material granular, nesse caso, areia. Sua granulometria está descrita na Tabela 1.
Observa-se que na Tabela 1, a maior porcentagem da massa ficou retida entre as peneiras de abertura 0,60 mm e 0,30 mm, correspondente ao diâmetro da areia conforme consta na NBR 7211 (ABNT, 2022a). Ainda, obteve-se o módulo de finura no valor de 2,52 que está de acordo com o intervalo de 2,20 a 2,90 que a NBR 7211 (ABNT, 2022a) caracteriza como areia de espessura média e estabelece como zona ótima. Lima et al. (2019) obteve valor que se enquadra na mesma faixa, sendo de 2,37. Tais resultados são determinantes para uma maior distribuição dos tamanhos dos grãos que resultará em uma argamassa mais homogênea e com melhores propriedades mecânicas. Conclui-se que o agregado pode ser empregado no presente estudo.
Por conseguinte, realizou-se o ensaio da densidade e absorção de água, a fim de obter a massa específica, bem como a massa unitária, as quais são relevantes para posteriormente determinar o consumo de água e cimento para produção adequada de argamassa, pois afetam diretamente a proporção, consistência, resistência, trabalhabilidade e durabilidade, conforme NBR 7211 (ABNT, 2022a). O resultado de 1,54 g/cm³ da massa unitária da areia é inferior ao de 2,62 g/cm³ da massa específica, valor semelhante ao encontrado por Golfetto et al. (2019) de 2,60 g/cm³. Isto é justificável, porque na primeira aferição considera-se o número de vazios, o que ocasiona uma menor densidade e consequentemente menor medição da massa em um dado volume.
Aglomerante
As características químicas, físicas e mecânicas do cimento foram fornecidas pelo fabricante e estão apresentadas na Tabela 2. Sendo escolhido o cimento CP V (Cimento Portland de Alta Resistência Inicial) para o presente estudo, pois é caracterizado por altas resistências nas primeiras idades, ou seja, aos 3 e 7 dias.
Portanto, o cimento está de acordo com as especificações da NBR 16697 (ABNT, 2018ab).
Fibras de sisal
Determinou-se a massa específica real, aparente, teor de umidade conforme adaptações da NBR 7190-1 (ABNT, 2022b) e absorção de água com base na NBR 10024 (ABNT, 2012c) modificada.
Massa específica real e aparente
Com o auxílio de uma tesoura, as fibras foram cortadas em comprimentos médios de 30 mm e aferidas por instrumento graduado de 0,5 mm de precisão (régua). Colocou-se um volume de sisal em um béquer de 80 ml, até a obtenção de 60 g de massa. Em seguida, as amostras foram imersas em água por 24h (Figura 1a).
Logo após esse período, as amostras foram dispostas sobre uma superfície plana sob uma leve corrente de ar, de modo que a água excessiva presente em sua superfície não interferisse nos resultados, então pesou-se as amostras, obtendo-se a massa saturada seca ao ar (Figura 1b).
As amostras foram inseridas em uma proveta com capacidade de 1 l contendo água cujo volume inicial (Vi) foi registrado previamente em 600 ml. Em seguida, realizou-se a leitura do volume final (Vf) em 610 ml, que correspondeu à elevação da coluna de água causada pela inclusão das fibras no tubo (Figura 1c).
Por fim, o material foi seco em estufa por 24 horas à 60 oC, obteve-se assim a massa seca. Calculou-se os parâmetros pelas Equações 1 e 2.
Ms = Massa seca (g);
Vf = Volume final (ml);
Vi = Volume inicial (ml);
Msat = Massa saturada (g);
𝝆água = Massa específica da água (g/cm³);
𝝆real = Massa específica real das fibras de sisal (g/cm³); e
𝝆aparente = Massa específica aparente das fibras de sisal (g/cm³).
Teor de umidade
O preparo das amostras para sua regularização assemelha-se ao anterior, desse modo, tais amostras, ficaram em estufa à 60 °C por 24h. Logo após a secagem, suas massas em gramas foram determinadas por meio de pesagem em balança semi-analítica e então ficaram expostas ao ar livre por mais 24h. Realizou-se novamente a pesagem destas, obtendo-se a massa seca ao ar das fibras. O cálculo do teor de umidade expresso em %, foi realizado por meio da Equação 3.
Msa = Massa seca ao ar (g); e
Ms = Massa seca (g).
Absorção de água
Preparou-se as amostras de acordo com os ensaios anteriores, então, foram submetidas em estufa por 24h à 60 oC, realizou-se a pesagem em gramas destas por meio de balança semi-analítica e em seguida, as três amostras foram imersas em água (a 20 ºC±2). A massa úmida foi determinada a cada 24h até o total de 72h. Para aferir a absorção, expressa em %, utilizou-se a Equação 4.
Mut = Massa úmida no tempo (g); e
Ms = Massa seca (g).
Dosagem e produção de corpos de prova
Dosagem
Após a caracterização dos materiais, realizou-se a fixação de consistência da argamassa em diâmetro de 255±10 mm na mesa de espalhamento, segundo a NBR 13276 (ABNT, 2005a) dos seguintes traços: 1:2; 1:2,25; 1:2,50; 1:2,75 e 1:3,0 (Cimento:Areia). Com a propriedade de consistência fixada, foram produzidas três amostras por traço sem adição de fibras, a fim de analisar qual obtém a maior resistência média mecânica à compressão dos aos 7 dias por empregar cimento de alta resistência inicial. Adotou-se o traço com melhor desempenho mecânico para inserção das fibras.
Produção de corpos de prova
Foram produzidas amostras com fibras de sisal em comprimentos de 20 mm e 30 mm, em porcentagens de 0,5% e 1,0% com base no volume de cimento.
Após a inserção das fibras, manteve-se a consistência da argamassa fixada em diâmetro de 255±10 mm na mesa de espalhamento para dar sequência na produção dos corpos de prova cilíndricos, para a realização do ensaio de resistência à compressão com o objetivo de avaliar a capacidade da argamassa suportar cargas aplicadas perpendicularmente a sua superfície de acordo NBR 13279 (ABNT, 2005b) e, corpos de prova prismáticos para o ensaio de resistência à tração na flexão, com o objetivo de avaliar a capacidade da argamassa de resistir à tração quando submetida a flexão conforme preconiza a NBR 12142 (ABNT, 2010).
O Quadro 2 apresenta o modelo esquemático dos corpos de prova realizados com fibras de sisal, os quais foram rompidos em 3 e 7 dias, utilizando 5 amostras.
Estudo estatístico
Para identificar se há diferenças significativas entre as médias das resistências mecânicas dos traços, utilizou-se a técnica ANOVA, a qual realiza análise da variância dos resultados a partir de cada ensaio. Para identificar quais grupos apresentam distinções entre si, utilizou-se o teste de médias de Scott-Knott, no software Sisvar.
Análise microscópica
O teste de MEV (Microscopia Eletrônica de Varredura) ocorreu por meio de equipamento TESCAN-VEGAN 3 com raios X por energia dispersiva (EDS), através da fixação do material de estudo em lâmina de vidro e aplicação de uma película de ouro como material condutor, em meio ao vácuo, e feixes de elétrons foram emitidos na amostra, estes responsáveis pela varredura na superfície para gerar imagens de alta resolução em magnificações de 3 kx, 5 kx e 12 kx. Assim, visualizou-se detalhes minuciosos da estrutura dos corpos de prova, o que possibilitou a análise na coesão e identificação de agentes que contribuem para o enfraquecimento do material quando submetido a ensaios mecânicos.
Resultados e discussões
Caracterização das fibras de sisal
Esse tópico trata a respeito dos resultados obtidos a partir da caracterização das fibras naturais de sisal, enfoque deste trabalho. Na Tabela 3, estão apresentados os valores dos ensaios em laboratório de caracterização física.
A massa específica real de 1.440,00 kg/m³ está próxima a pesquisa que obteve o valor de 1.540 kg/m³, onde o sisal forneceu a matriz cimentícia, aumento na flexão e propagação de trincas mais lentas quando submetida a solicitações, em comparação ao convencional (Filho et al., 2021). Já a massa aparente de 525,33 kg/m³ do sisal caracterizado, está próxima ao de trabalho que obteve 440 kg/m³ para a mesma, que apresentou ganho de resistência à tração por compressão diametral na inserção da fibra em argamassa, possuindo assim um potencial de aplicação em matrizes cimentícias que necessitam de resistência a esse tipo de solicitação, como a empregada em revestimentos cerâmicos, assentamentos de azulejos e fachadas (Dias et al., 2021).
Ainda, observou-se um baixo teor de umidade e uma absorção de água em 72 horas de 150,85%, próxima ao estudo de Iniya e Nirmalkumar (2021) que alcançou valor de 149% para o mesmo período. O desvio padrão e o coeficiente de variação baixos no teor de umidade, bem como na absorção de água, demonstram homogeneidade da amostra que consequentemente promove durabilidade prolongada da fibra em compósitos cimentícios. Tais parâmetros são responsáveis pela carbonatação, sendo importante projetar e dosar a argamassa, para evitar fissuras causadas por variações bruscas de umidade ou temperatura (Lima et al., 2019). Já o maior desvio e o coeficiente de variação na massa específica real são justificáveis por se tratar de fibras naturais, podendo apresentar propriedades variantes devido a fatores como o local do plantio e metodologia de ensaio.
Traço referencial e ensaios mecânicos nos corpos de prova
Traço referencial
Inicialmente, realizou-se três corpos de prova cilíndricos obtendo-se a média da resistência mecânica à compressão dos traços 1:2; 1:2,25; 1:2,50; 1:2,75 e 1:3,0 (Cimento:Areia), segundo NBR 7215 (ABNT, 2019). Na Tabela 4 estão dispostos os resultados.
O traço 1:2,25 foi o que apresentou melhor desempenho, com resistência mecânica a compressão de 7 dias em 38,46 MPa. Além disso, seu coeficiente de variação baixo em 2,24% indica que a amostra apresenta uma melhor homogeneidade, uniformidade e que os dados estão mais consistentes e próximos uns dos outros. Portanto, adotou-se o traço 1:2,25 como referencial e prosseguiu-se o estudo com a inserção de fibras no mesmo.
Ensaio de resistência à compressão e tração na flexão
A Tabela 5 apresenta os resultados de resistência à compressão e tração na flexão dos corpos de prova aos 3 e 7 dias de cura.
A Figura 2 ilustra a representação dos resultados das médias de resistência à compressão e tração na flexão.
Pelos resultados indicados através da Figura 2, nota-se uma tendência no aumento de resistência à compressão aos 7 dias. Entretanto, com o uso das fibras de 30 mm a resistência diminuiu aos referidos 7 dias nas adições de 0,5% e 1,0% em 39,37% e 19,31% respectivamente. Tal acontecimento, pode estar relacionado a pontos de concentração gerados pela dificuldade das fibras longas se distribuírem no decorrer da amostra, ocasionando locais de falha e redução da resistência do material por meio de poros. Já nos ensaios realizados de resistência à tração, os resultados aos 7 dias só não superaram as amostras com fibras de 20 mm e 1% de adição, onde ocorreu a redução da resistência em 18,15%. Possivelmente por se tratar de um maior volume de adição, ocorreu distribuição não uniforme do material, que ocasionou pontos fracos e reduziu a resistência global, similar ao estudo de Dias et al. (2021) com adição na argamassa da fibra de 30 mm em 0,5% em relação ao volume de cimento, havendo uma queda na resistência à compressão de 24,14% aos 28 dias, mas um ganho na resistência à tração de 60% após mesmo período. Ou seja, a medida em que a compressão declina, percebe-se uma tendência de melhora na resistência à tração.
Com relação ao traço convencional nos ensaios à compressão e tração na flexão aos 3 dias, quando comparado aos demais do mesmo período de cura, observa-se um melhor desempenho nas amostras com adição de 0,5% em relação ao volume de cimento. À compressão notou-se um aumento de 12,78% com fibras de 20 mm e de 6,71% com fibras de 30 mm. Já na tração na flexão o aumento foi de 6,84% e 0,73% respectivamente. Isto é justificável, pois em tal situação as fibras em menor quantidade podem se dispersar de forma mais uniforme na matriz cimentícia, aumentando a capacidade de deformação do material antes da ruptura. Desse modo, evitam-se os pontos de concentração e há contribuição no reforço da estrutura de maneira mais homogênea (Izquierdo; Ramalho, 2014).
Já o traço convencional à compressão e tração na flexão aos 7 dias de cura analisado em relação aos demais, apresentou um melhor resultado com exceção aos com fibras de 20 mm e adição de 0,5% em relação ao volume do cimento, que considerando a margem de erro, equiparou-se. Tal fato pode estar relacionado a reações químicas internas. Pois, durante o tempo de cura ocorre reação de hidratação do cimento exotérmica, a qual pode deteriorar as fibras com o aquecimento, e, além disso, as fibras reagem de maneira diferente à umidade em comparação com a matriz cimentícia, o que ocasiona variações dimensionais que afetam a resistência do corpo de prova por promover o aumento no número de poros na microestrutura durante o processo (Lima et al., 2019). Entretanto, o melhor resultado com as fibras de 20 mm e 0,5% de adição faz-se presente, pois fibras naturais comportam-se de formas variadas e em uma amostra com melhor distribuição ocasionada pela facilidade que esse traço é capaz de gerar em relação aos demais, os danos internos durante as reações químicas são minimizados, assim como na pesquisa de Filho et al. (2021) que utilizou fibra de 20 mm em porcentagem de 0,5% e obteve um aumento de 24% na resistência à compressão e 18% à tração.
Análise estatística
Na Tabela 6, estão dispostos os resultados da técnica ANOVA, utilizando p-valor < 0,05 para avaliar possíveis diferenças significativas entre as médias dos grupos, juntamente com o teste Scott-Knott que identificou quais grupos possuem diferenças entre si.
Médias indicadas por letras distintas na mesma coluna apresentam diferença estatística pelo teste de Scott-Knott.
Nas médias dos grupos de amostras aos 3 dias de cura não houve diferenças significativas pelo indicativo do p-valor < 0,05 negativo de 0,05 para compressão e 0,30 à tração na flexão. Isto se comprova pelo teste Scott-Knott que apontou uma mesma classificação pela letra a, dos grupos. No entanto, nas médias dos grupos de amostras aos 7 dias ocorreram diferenças significativas pelo indicativo do p-valor < 0,05 verdadeiro de 0,00 para amostras de ambos ensaios mecânicos. Através do teste Scott-Knott, isto se comprovou, pois há classificações diferentes entre os grupos indicados pelas letras a e b.
Portanto, nota-se que os traços aos 3 dias não apresentam diferenças significativas de resistência mecânica, já os de 7 dias possuem uma variabilidade maior à compressão nas amostras com fibras de 30 mm e à tração nos corpos de prova com 1% de adição. Isto pode ocorrer devido ao maior tempo em que os materiais ficaram expostos a influências externas, como variações de temperatura e umidade. Além disso, o processo de cura da argamassa pode ter impacto nessa disparidade, devido a dosagens diferentes de água nos traços, para apresentarem diâmetro semelhante na mesa de espalhamento.
O considerável coeficiente de variação nas médias de resistência dos corpos de prova, além de estarem ligados a fatores externos, também pode ser explicado pela diversidade das fibras naturais adicionadas, que possuem distinções devido a variações genéticas, ambientais e sazonais (Lima et al., 2019).
Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV)
Nas Figuras 3a, 3b e 3c ilustra-se a microscopia de varredura em amostra com adição de 0,5% de fibras de sisal. Já as Figuras 3d, 3e e 3f elucida o que ocorre em corpo de prova com 1% de adição de fibras. Ambas as amostras com fibras de comprimento de 30 mm.
Na Figura 3a, identificou-se pelo seu formato angular a presença de quartzo que é um mineral rígido contribuinte para resistência à abrasão da argamassa, assim como também se encontrou C-S-H conhecido como silicato de cálcio hidratado, um dos principais produtos da reação de hidratação do cimento Portland que em contato com a água, forma o gel de C-S-H com forma amorfa responsável pelo preenchimento dos espaços vazios. Ainda, nas Figuras 3b, 3c, 3d e 3e verificou-se a presença de portlandita em formato de cristais e prismas hexagonais resultante da hidratação do cimento responsável pelo processo de cura, notou-se nas Figuras 3b e 3d carbonato de cálcio (CaCO3) romboédrico derivado da areia e cimento Portland que atua como agente de preenchimento que melhora a trabalhabilidade do material, e também etringita na Figura 3c em formato de cristais alongados que contribuem no controle de retração da argamassa (Schwantes, 2017). Ao final, na Figura 3f o sisal, fibra natural utilizada para avaliar seu comportamento mecânico em meio a matriz cimentícia.
Nas Figuras 3a, 3b e 3c, nota-se uma maior coesão na amostra de adição em 0,5% comparado as Figuras 3d, 3e e 3f com 1% de adição de fibras. Além disso, nas Figuras 3d, 3e e 3f identificou-se uma maior quantidade de portlandita e CaCO3 que, quando em excesso, ocasiona carbonatação e eflorescências na amostra, reações que alteram a alcalinidade, degrada as fibras inseridas e afeta a aderência entre o sisal e a argamassa (Brekailo; Pereira, 2018). Devido a isto, nota-se uma degradação no sisal (Figura 3f) com fendas consideráveis, o que justifica o fato de os ensaios mecânicos realizados com 1% de fibras resultarem em tensões inferiores aos demais com 0,5% de adição.
Conclusões
A utilização da fibra natural de sisal em matriz cimentícia apresenta um potencial promissor para melhorar o desempenho da argamassa. Além de promover a sustentabilidade e ocasionar a movimentação da economia na região nordeste do Brasil, essa fibra demonstrou características que contribuem para a resistência à compressão e tração na flexão aos 3 dias de cura da argamassa, onde ocorreu o aumento de resistência mecânica em 12,78% e 6,84% respectivamente, nos corpos de prova com fibras de 20 mm de comprimento e 0,5% de adição em relação ao volume de cimento. Embora haja uma variabilidade natural nas propriedades do sisal, como tamanho, resistência e teor de umidade, por meio da análise estatística e microscópica, verificou-se que é possível projetar e dosar o material de forma adequada para evitar problemas causados por variações bruscas de temperatura ou umidade. Contudo, espera-se que essa pesquisa fomente o estudo da fibra de sisal em compósito cimentício, a fim de impactar positivamente a sociedade com materiais sustentáveis, econômicos e de qualidade. Sugere-se estudos futuros que analisam a influência das fibras na consistência da argamassa e com as fibras tratadas previamente, com o objetivo de ocasionar sua conservação, melhorar a aderência na matriz cimentícia e reduzir o número de poros responsáveis pela queda na resistência mecânica.
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» https://abrecon.org.br/artigos/70-do-entulho-no-brasil-e-descartado-incorretamente
Editado por
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Editores:
Marcelo Henrique Farias de Medeiros e Eduardo Pereira
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
10 Mar 2025 -
Data do Fascículo
Jan-Dec 2025
Histórico
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Recebido
25 Mar 2024 -
Aceito
16 Jun 2024