Open-access Gerenciamento de custos hospitalares: significados atribuídos por diretores de divisão de enfermagem

Gestión de costos hospitalarios: significado atribuido por directores de división de enfermería

Resumo

Objetivo:  Compreender o significado atribuído por Diretores de Divisão de Enfermagem ao processo de gerenciamento de custos hospitalares.

Métodos:  Pesquisa qualitativa e exploratório-descritiva (modalidade: estudo de caso único) foi conduzida em um Hospital Universitário. As entrevistas concedidas por cinco diretores foram gravadas, transcritas e submetidas à análise de conteúdo.

Resultados:  Os diretores entenderam o gerenciamento de custos como uma importante atribuição dos enfermeiros, independentemente de sua posição administrativa. Diante de orçamentos restritos e recursos limitados, o conhecimento sobre o tema ajuda a fundamentar as decisões sobre os insumos necessários à assistência segura e de qualidade e contribui para estruturar processos licitatórios exitosos. Para potencializar o gerenciamento, eles indicaram a necessidade de favorecer a capacitação e sensibilização dos profissionais de atendimento sobre o uso racional e eficiente dos recursos e dos custos a eles associados. Nesta perspectiva, eles enfatizaram a pertinência de os enfermeiros adquirirem conhecimentos específicos para ajudar na argumentação qualificada sobre o custo-benefício de aquisição de insumos hospitalares.

Conclusão:  Para os Diretores de Divisão de Enfermagem, o gerenciamento de custos, é um instrumento imprescindível à atuação dos enfermeiros. O gerenciamento de custos fundamenta o uso adequado de recursos materiais para promover a segurança assistencial, evitar desperdícios e minimizar perdas financeiras.

Descritores
Gestão de recursos da equipe de assistência à saúde; Eficiência organizacional; Análise de custo-eficiência; Otimização de processos; Redução de custos; Custos hospitalares

Abstract

Objective:  To understand the meaning attributed by nursing division directors to the hospital cost management process.

Methods:  Qualitative and exploratory-descriptive research (modality: single case study) was conducted in a university hospital. The interviews given by five directors were recorded, transcribed and submitted to content analysis.

Results:  The directors understood cost management as an important task for nurses, regardless of their administrative position. Given tight budgets and limited resources, knowledge on the subject helps to support decisions on the supplies needed for safe and quality care, and contributes to structuring successful bidding processes. To enhance management, they indicated the need to promote training and awareness among care professionals on the rational and efficient use of resources and costs associated with them. From this perspective, they emphasized the relevance of nurses acquiring specific knowledge to help in qualified argumentation on the cost-benefit of acquiring hospital supplies.

Conclusion:  For nursing division directors, cost management is an essential tool for nurses’ performance. Cost management underpins the appropriate use of material resources to promote healthcare safety, avoid waste and minimize financial losses.

Resumen

Objetivo:  Comprender el significado atribuido al proceso de gestión de costos hospitalarios por directores de una división de enfermería.

Métodos:  Estudio cualitativo y exploratorio-descriptivo (modalidad: estudio de caso único), llevado a cabo en un hospital universitario. Las entrevistas concedidas por cinco directores fueron grabadas, transcriptas y sometidas al análisis de contenido.

Resultados:  Los directores entienden la gestión de costos como una importante atribución de los enfermeros, independientemente de cuál sea su posición administrativa. Ante presupuestos y recursos limitados, los conocimientos sobre el tema ayudan a fundamentar las decisiones sobre los insumos necesarios para una atención segura y de calidad y contribuyen con la elaboración de procedimientos licitatorios exitosos. Para maximizar la gestión, señalaron la necesidad de promover capacitación a los profesionales de asistencia y sensibilización sobre el uso racional y eficiente de los recursos y de los costos asociados. Bajo esta perspectiva, los directores resaltaron la relevancia de que los enfermeros adquieran conocimientos específicos para ayudar en la argumentación cualificada sobre el costo-beneficio de adquirir insumos hospitalarios.

Conclusión:  Para los directores de la división de enfermería, la gestión de costos es un instrumento imprescindible para el trabajo de los enfermeros. La gestión de costos fundamenta el uso adecuado de los recursos materiales para promover la seguridad asistencial, evitar desperdicios y minimizar pérdidas financieras.

Descriptores
Gestión de recursos de personal en salud; Eficiencia organizacional; Análisis costo-eficiencia; Optimización de procesos; Ahorro de costo; Costos de hospital

Introdução

A população precisa receber cuidados de alta qualidade para melhorar sua saúde e conquistar a confiança em diferentes contextos, independentemente do sistema de saúde vigente. Necessidades de saúde em mudança, expectativas crescentes dos usuários e novas metas de saúde estão elevando o nível dos sistemas de saúde para produzir melhores resultados e maior valor social. Para isso, é necessário otimizar os processos assistenciais prestando cuidados que mantenham e/ou melhorem a saúde, valorizem seus usuários e respondam às necessidades da população.(1)

Os gastos associados à prestação de serviços são crescentes e a área hospitalar é a maior e mais dispendiosa aos sistemas de saúde. Além disso, as organizações têm sido pressionadas a equilibrar suas despesas reduzindo estrategicamente os custos, sem prejuízo à qualidade, com ações que não comprometem a satisfação e a experiência dos pacientes.(2)

A busca sustentada por atendimento hospitalar, com pacientes chegando aos hospitais com demandas de cuidados mais complexas e permanecendo internados por mais tempo, somada às graves repercussões socioeconômicas mundiais da pandemia da COVID-19,(3,4,5,6) aumentaram os desafios financeiros existentes.(7) Com uma crescente demanda e um grande déficit financeiro nos serviços de saúde, a maior ameaça à sua sustentabilidade (reconhecida como um domínio importante e legítimo da qualidade em saúde) é mais frequentemente identificada como restrições financeiras.(8)

Dada a escassez dos recursos destinados à área da saúde na realidade brasileira, é pertinente o compromisso dos líderes institucionais com o modelo de gestão organizacional, gerenciamento de custos e suas repercussões nos diferentes processos de trabalho. Foi confirmado que tal compromisso é indispensável à prestação de serviços de saúde seguros, eficientes, eficazes e economicamente sustentáveis.(9)

Ressaltamos que é imprescindível a participação de enfermeiros que ocupam diferentes cargos de liderança administrativa sobre os aspectos econômicos necessários à sustentabilidade financeira da diuturna assistência hospitalar. Portanto, o presente estudo foi realizado para compreender o significado atribuído por Diretores de Divisão de Enfermagem ao gerenciamento de custos hospitalares.

Métodos

Pesquisa qualitativa, exploratório-descritiva, do tipo estudo de caso único,(10) foi estruturada conforme as diretrizes do instrumento Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ) da Equator Network.(11)

A pesquisa foi realizada no Departamento de Enfermagem (DE) de um hospital universitário (HU) em uma universidade pública paulista (que é integrante do Sistema Único de Saúde, SUS), cujos objetivos têm sido consolidados pelo ensino, pesquisa e extensão de seus serviços à comunidade.(12)

O DE é ligado à superintendência do HU e visa coordenar, supervisionar e controlar as atividades desenvolvidas nas áreas de ensino, pesquisa e assistência de enfermagem. O DE tem cinco Divisões: 1) Enfermagem Clínica (abrangendo as Unidades de Terapia Intensiva de Adultos e Clínica Médica, Serviço de Hemodiálise e Programa de Assistência Domiciliar); 2) Enfermagem Cirúrgica (abrangendo as Unidades de Clínica Cirúrgica, Centro Cirúrgico, Central de Material e Esterilização e Hospital Dia); 3) Enfermagem Pediátrica (abrangendo as Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatal, Pediatria e Pronto Socorro Infantil); 4) Enfermagem Obstétrica e Ginecológica (abrangendo o Centro Obstétrico, Alojamento Conjunto e Unidade Neonatal); e 5) Enfermagem de Pacientes Externos (abrangendo o Ambulatório de Imagenologia e Endoscopia, Pronto Socorro de Adultos, Unidade Básica de Atendimento à Saúde e Classificação de Risco).(12)

O pesquisador responsável pelo presente estudo atuou no HU (20 anos) e é docente (14 anos) em uma das Escolas de Enfermagem da Universidade supracitada. A Universidade investe continuamente para fortalecer a articulação acadêmico-assistencial com o HU visando a excelência no ensino, pesquisa e assistência de enfermagem. Tais metas estão no âmbito de suas áreas de atuação e capacidade técnica, no planejamento e operacionalização das diretrizes na área da enfermagem e na definição dos princípios que fundamentam o cuidado de enfermagem. Assim, este estudo contou com a participação (por conveniência) dos cinco Enfermeiros Diretores de Divisão (EDD) atuantes no DE.

O pesquisador acima consultou previamente os EDD (via telefone) sobre seu interesse e disponibilidade em participar no estudo. Todos aceitaram participar após a descrição do projeto (iniciação científica, IC) e apresentação do objetivo. Os dados foram coletados em uma sala de reuniões do DE (22/11/2023) nos horários por eles indicados. Antes do início das entrevistas, um estudante de IC coletou dados para caracterização de cada participante. Em seguida, o pesquisador responsável usou uma gravação de áudio para conduzir as entrevistas a partir da questão norteadora: Qual significado você atribui ao gerenciamento de custos em sua prática profissional? A duração das entrevistas teve um tempo médio de 16 minutos. As notas de campo foram feitas pelo estudante durante cada entrevista.

As entrevistas gravadas foram transcritas pelo estudante e suas transcrições foram devolvidas aos participantes que as aprovaram sem comentários e/ ou correção. Depois, elas foram codificadas por siglas e submetidas a análise de conteúdo, definida como um conjunto de técnicas de análise de comunicação. Seu objetivo foi obter indicadores que permitem inferir conhecimentos relativos às condições de produção e recepção das mensagens usando procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição. Este processo compreendeu as fases de pré-análise, exploração do material e interpretação do conteúdo.(13)

Os trâmites legais estabelecidos pela Resolução 466 (12/12/2012), que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, foram cumpridos rigorosamente. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição proponente (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética: 71870123.2.0000.5392) (Parecer: 6.333.675).

Resultados

Para os cinco EDD, foram calculados a idade média (53,4 anos) e os tempos médios de formado (30,6 anos), atuação em cargo gerencial (18,8 anos) e como EDD (8,2 anos). Eles tinham títulos de doutor (4) e mestre (1). A análise de conteúdo das entrevistas permitiu construir a categoria Significados atribuídos ao gerenciamento de custos na prática profissional de enfermeiro e três subcategorias: (1) acesso ao conteúdo sobre gerenciamento de custos durante a trajetória acadêmica; (2) percepção da associação entre a atuação de enfermeiros e o gerenciamento de custos e (3) desenvolvimento de ações visando o controle dos custos hospitalares.

Categoria de significados atribuídos ao gerenciamento de custos na prática profissional de enfermeiros

Os EDD consideraram o gerenciamento de custos como uma importante atribuição aos enfermeiros, independentemente de eles ocuparem ou não uma posição administrativa. Considerando os recursos finitos, eles reportaram que tal conhecimento ajuda a fundamentar o processo decisório sobre os insumos necessários à assistência segura e de qualidade, bem como à condução exitosa de processos licitatórios. Eles também enfatizaram os custos associados aos recursos materiais e a pertinência de os enfermeiros usarem conhecimentos específicos para ajudar na argumentação qualificada sobre o custo-benefício de sua aquisição:

“Em qualquer instituição de saúde, é muito importante gerenciar os custos pois os recursos disponíveis são limitados. É necessário atentar para o consumo de materiais e sua qualidade, estabelecer adequadamente sua previsão e provisão, bem como controlar os estoques evitando desperdícios e perdas financeiras”. (EDD1)

“Gerenciar os custos é muito importante para todos envolvidos na prestação da assistência. Conhecer os materiais e seus custos ajuda a tomar decisões quanto à sua requisição e aquisição. Investir na melhor descrição dos materiais e sua testagem ajuda no processo licitatório, considerando a relação custo-benefício das aquisições”. (EDD2)

“O gerenciamento de custos é muito importante pois ajuda nas decisões estratégicas sobre os investimentos para novas aquisições de materiais. Ele fortalece a argumentação nas negociações sobre os procedimentos com o contrato do SUS”. (EDD3)

“O gerenciamento de custos é muito importante pois os recursos são finitos independente do financiador. É preciso compreender o sistema público de compras: como é realizado o processo de licitação, suas possibilidades e desafios, a legislação vigente, os diferentes fornecedores e as especificidades de materiais demandados pelas diferentes unidades assistenciais”. (EDD4)

“O gerenciamento de custos é um instrumento potente para fundamentar a previsão e a provisão de recursos materiais nas quantidades adequadas, assegurando a qualidade assistencial. É preciso conhecer os materiais e equipamentos disponíveis no mercado, seus preços, o impacto financeiro de sua aquisição e os benefícios a ela associados”. (EDD5)

Subcategoria 1: Acesso ao conteúdo sobre gerenciamento de custos durante a trajetória acadêmica

Só dois EDDs informaram ter tido informação sobre custos durante a graduação; porém, todos destacaram o contato com esse tema em níveis distintos durante os cursos de pós-graduação (stricto et lato sensu):

“Só comecei a me aproximar do tema quando cursei uma disciplina para o doutorado. Ele é um desafio: cada vez que eu leio sobre gerenciamento de custos, preciso retomar os conceitos principais”. (EDD1)

“Vejo que a maioria dos enfermeiros assistenciais não tiveram formação sobre gerenciamento de custos na graduação. Só tive uma abordagem breve e superficial sobre o tema ao cursar especializações em Saúde Pública e Administração Hospitalar”. (EDD2)

“Incialmente, tive um contato superficial com o tema quando cursei Especialização em Administração Hospitalar, ampliando o conhecimento quando cursei disciplinas específicas no mestrado e no doutorado”. (EDD3)

“Na graduação, tive uma abordagem detalhada sobre gerenciamento de custos, que foi aprofundada em disciplinas durante o mestrado e o doutorado: diferentes tipos e metodologias de custeio, conhecimentos da contabilidade de custos aplicados à tomada de decisão sobre a pertinência ou não de adquirir insumos”. (EDD4)

“Tive uma abordagem sobre custos na graduação. Esse conhecimento foi se fortalecendo nos cursos realizados durante a carreira profissional, principalmente quando investi na pós-graduação stricto sensu”. (EDD5)

Subcategoria 2: Associação entre a atuação de enfermeiros e o gerenciamento de custos

Os EDD explicitaram a repercussão favorável da articulação entre os enfermeiros gerentes (em diferentes níveis organizacionais) e os profissionais da área do cuidado. A articulação amplia a participação coletiva nas tomadas de decisão conforme o nível de governabilidade, incrementando o uso racional dos materiais, evitando desperdícios e a formação de estoques:

“Entre nós, EDD, discutimos a qualidade dos recursos materiais, seu bom uso e a análise de custos para que tais conhecimentos também sejam disponibilizados aos profissionais na área do cuidado. Todos profissionais de enfermagem precisam usar os recursos da melhor forma possível (racionalmente) sem estocá-los nas unidades”. (EDD1)

“Seria muito importante que os enfermeiros conhecessem bem as características e os custos dos produtos consumidos na assistência para fundamentar melhor as escolhas de aquisição”. (EDD2)

“Os enfermeiros devem ter uma noção mínima sobre controle de custos, considerando a qualidade dos materiais e equipamentos, especialmente em um hospital-escola compromissado com: qualidade assistencial, formação de futuros profissionais de saúde e segurança dos pacientes atendidos”. (EDD3)

“Na prática assistencial, os enfermeiros devem ter conhecimento sobre gerenciamento de custos para ampliar o entendimento sobre a finitude dos recursos, fortalecer sua participação nos processos decisórios, aprimorar seu papel nas questões administrativas e obter os recursos requeridos”. (EDD4)

“Os enfermeiros devem conhecer os custos dos materiais e discutir a importância de seu uso adequado para melhorar os resultados desejados e evitar desperdícios no processo assistencial”. (EDD5)

Subcategoria 3: Desenvolvimento de ações visando o controle dos custos hospitalares

Os EDD exemplificaram ações estratégicas desenvolvidas individual ou conjuntamente para minimizar e/ou controlar os custos nas unidades assistenciais. Tais ações abrangeram desde favorecer o acesso às informações sobre novos produtos disponíveis no mercado e custos dos materiais consumidos, incluindo sensibilizar os usuários sobre a necessidade do uso racional dos insumos (conforme o quadro clínico dos pacientes) e os resultados desejados, até usar o sistema institucional eletrônico de apoio à decisão:

“Tenho sensibilizado os profissionais da área do cuidado sobre os custos dos materiais pois o acesso ao conhecimento fundamenta o uso racional desses recursos evitando desperdícios”. (EDD1)

“Temos analisado as previsões de materiais junto com a gerente de materiais buscando novas alternativas disponíveis no mercado para estruturar o processo licitatório. Além disso, visitamos outras instituições para compreender melhor o processo decisório sobre os tipos de materiais e nos reunimos com representantes comerciais e a equipe de saúde para avaliar o custo-benefício de determinadas aquisições”. (EDD2)

“Tenho participado nas negociações de procedimentos ambulatoriais junto à Secretária Estadual de Saúde ajudando a alcançar os indicadores estabelecidos e evitando a ocorrência de glosas dos repasses financeiros. Periodicamente, revisamos e atualizamos a lista de procedimentos, investindo também na manutenção e aprimoramento do Sistema de Gerenciamento de Materiais (SGM) institucional. Este ajuda a controlar e reduzir custos, sensibilizando os trabalhadores sobre os custos dos materiais para que eles os usem racionalmente evitando desperdícios”. (EDD3)

“Tenho ajudado nas estratégias de previsão e provisão dos recursos materiais e na apreciação dos contratos sobre aquisição de insumos, emitindo pareceres, considerando a qualidade, os custos e sua repercussão na segurança assistencial”. (EDD4)

“Com o SGM controlamos os recursos materiais, verificando como ocorre o consumo de determinados itens, correlacionando-o com as demandas de requisição, a taxa de ocupação da unidade e o perfil dos pacientes atendidos. Então, nos reunimos com a enfermeira-chefe da unidade e o técnico de material para sensibilizar as equipes, orientando para ajustar distorções em relação aos padrões esperados”. (EDD5)

Discussão

Os EDD participantes no presente estudo atribuíram importância ao conhecimento sobre o gerenciamento de custos para fundamentar a atuação dos enfermeiros independentemente de eles terem cargos deliberativos nas organizações hospitalares. Tal compreensão foi confirmada, mas ressaltamos que tais conhecimentos são imprescindíveis em posições gerenciais. Eles permitem subsidiar a eficiência e eficácia das tomadas de decisão sobre a viabilização dos diferentes processos de trabalho que requerem uma distribuição racional de recursos humanos, materiais e estruturais. Estes são geralmente limitados e mantidos com orçamentos restritos, principalmente em serviços públicos de saúde.(14)

Os enfermeiros têm sido crescentemente responsabilizados por tomar decisões relativas à estrutura, processos e resultados assistenciais em diferentes níveis de atenção independente da natureza jurídica (pública, privada ou filantrópica) dos serviços de saúde.(15) Porém, devido ao limitado montante financeiro destinado à saúde, os profissionais de saúde geralmente vivenciam condições precárias de trabalho nos hospitais públicos quanto à estrutura física, insuficiência de profissionais e falta de leitos.(16)

Neste cenário, a participação qualificada dos enfermeiros nos processos decisórios de hospitais universitários requer conhecimento além de expertise na prática assistencial pois eles são responsáveis pela sustentabilidade do tripé ensino-pesquisa-assistência. Além disso, sua participação qualificada requer desenvolvimento de habilidades sobre gerenciamento de custos para maior eficiência na alocação de recursos limitados, evitando assim desperdícios e prejuízos econômico-assistenciais.(15)

Mesmo considerando que o gerenciamento de custos não se restringe ao gerenciamento de recursos materiais, os EDD destacaram reiteradamente a relevância de prever e prover recursos materiais, favorecendo a capacitação dos profissionais de saúde e enfermeiros. Eles devem usar o conhecimento dos custos associados à sua aquisição para estimular o uso racional, evitando assim desperdícios no processo assistencial.

Uma revisão narrativa da literatura (amostra: 44 artigos de enfermeiros) mostrou as contribuições e avanços associados à produção no tema sobre gerenciamento de custos e translação de conhecimento. Uma parte dos estudos (63,6%) foi conduzida em Hospitais Públicos de Ensino e Pesquisa (HPEP) financiados pelo SUS. Os resultados econômico-financeiros obtidos propiciaram uma revisão de procedimentos ou processos para uma alocação racional de recursos escassos, principalmente recursos materiais.(15)

Os hospitais universitários são responsáveis pela maior parcela de atendimento do SUS, sendo estimado que eles consumem 70% dos gastos públicos. Porém, o agravamento na crise de financiamento repercutiu no montante destinado às universidades e, assim, parte dos gastos em HPEP tem sido coberta com fundo de custeio. Assim, gerenciar custos é importante para as políticas internas de reinvestimentos e sustentabilidade a curto, médio e longo prazos.(17)

A escassez de recursos físicos, materiais e de pessoal qualificado pode resultar tanto na interrupção da prestação de serviços de saúde quanto na compra de materiais e equipamentos por profissionais que desconhecem as especificações adequadas.(18)

Neste sentido, destacamos entre os desafios relativos aos conhecimentos específicos que é também necessário aos enfermeiros em cargos gerenciais se aprimorarem em relação à legislação vigente para melhorar sua participação em acordos e contratos entre a organização que eles representam e as instâncias financiadoras do SUS.

Por exemplo, desde janeiro de 2024, a Lei 14.133/2021 (Licitações e Contratos Administrativos)(19) se tornou a única lei federal que regulariza e unifica os procedimentos de licitações e contratos. Para sua efetiva implantação, ela requer a capacitação dos servidores públicos, mudança cultural, aperfeiçoamento dos sistemas de controle e adequação dos sistemas e processos. Em sua aplicação, serão observados os princípios seguintes: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, eficácia, interesse público, probidade administrativa, igualdade, planejamento, transparência, segregação de funções, motivação, vinculação ao edital, julgamento objetivo, segurança jurídica, razoabilidade, competitividade, proporcionalidade, celeridade, economicidade e desenvolvimento nacional sustentável.(19)

Como os orçamentos dos hospitais são apertados e não acompanham o aumento na demanda por serviços de saúde, os gestores e gerentes são pressionados a buscar estratégias para reduzir os custos hospitalares associados a vários recursos materiais e melhorar seu desempenho operacional. Neles, a cadeia de abastecimento é composta por fornecedores externos (empresas farmacêuticas, fabricantes e distribuidores), centrais de armazenamento e pontos de utilização (unidades e serviços de Divisões assistenciais) e usuários finais (pacientes). A cadeia externa de abastecimento abrange todas transações com fornecedores ao passo que a cadeia interna se relaciona com todos os produtos e fluxos de informação.(20)

Neste sentido, destacamos que o gerenciamento eficaz da cadeia de abastecimento de materiais hospitalares proporciona oportunidades significativas de melhoria em eficiência e redução de custos. Ela é distinta de outros contextos devido às suas peculiaridades (ênfase na segurança dos pacientes, perecibilidade, estocasticidade etc.). Então, para otimizar seu desempenho nos diferentes níveis operacionais, as decisões estratégicas, táticas e operacionais devem ser tomadas de forma colaborativa e integrada.(21)

Um estudo recente indicou a pertinência do conhecimento aprofundado e do uso adequado de recursos materiais para identificar, analisar e reduzir desperdícios. Eles geram custos e o consumo de recursos financeiros pode ser redirecionado para beneficiar outros pacientes se evitado. Foi salientada a relevância dos enfermeiros e demais profissionais de enfermagem no reconhecimento de possíveis fontes de desperdício e sua minimização com medidas preventivas, contribuindo assim para a eficiência dos processos e sustentabilidade financeira das organizações.(22)

Alguns EDDs reportaram que o conteúdo sobre gerenciamento de custos não foi ministrado durante sua graduação. Quando tal abordagem ocorreu depois, ela foi superficial, sendo ministrada só após o ingresso em cursos de pós-graduação ou cursos específicos sobre o tema.

Devido ao aumento nos custos associados à prestação de cuidados de saúde, os líderes de enfermagem devem aprimorar suas habilidades financeiras para defender as necessidades das equipes e pacientes enquanto apoiam a missão, visão e valores organizacionais. Como os gestores de enfermagem são frequentemente responsabilizados pela concepção, implementação e monitoração orçamentaria, o adequado planejamento financeiro deve abranger ações colaborativas junto à área financeira. Assim, entendemos que os enfermeiros líderes competentes para gestão financeira e orçamental estão melhor preparados para manejar os desafios crescentes de gerenciar custos, alocar recursos e gerenciar equipes.(23)

Confirmamos que a aquisição de conhecimentos sobre gerenciamento de custos e sua adequada aplicação na prática assistencial e gerencial requer investimentos pessoais e institucionais para capacitar enfermeiros. Tais investimentos devem abranger os aspectos financeiros da prestação de serviços de saúde, considerando a otimização de recursos limitados, sua repercussão no acesso e equidade aos usuários e manutenção da qualidade assistencial.(14) Por um lado, os enfermeiros devem se comprometer e investir em sua formação continuada, principalmente em relação à aquisição de conhecimentos específicos como o gerenciamento de custos. Por outro lado, as instituições formadoras e assistenciais também devem estar envolvidas na capacitação sobre as dimensões econômico-financeiras associadas à prestação de serviços de saúde seguros e de qualidade.

Finalmente, este estudo de caso único foi uma investigação criteriosamente delimitada, claramente definida e com especificidades do tema no contexto real onde ocorre.(10) Ele permitiu compreender melhor um processo específico que ocorre no contexto social, mostrando os significados do gerenciamento de custos hospitalares reportados por EDDs.

Conclusão

Para os Enfermeiros Diretores de Divisão no Departamento de Enfermagem do Hospital Universitário campo de estudo, o processo de gerenciamento de custos em diferentes contextos assistenciais e níveis deliberativos é um instrumento imprescindível à atuação dos enfermeiros. Ele fundamenta: (a) as decisões sobre os recursos limitados (humanos, materiais, estruturais e financeiros) necessários à prestação de serviços de saúde seguros e de qualidade, (b) a condução exitosa de processos licitatórios e (c) a participação em negociações com instâncias deliberativas responsáveis pelo repasse dos recursos financeiros. Os Enfermeiros Diretores de Divisão enfatizam a necessidade de previsão e provisão adequadas de recursos materiais para promover segurança assistencial, aumentar seu uso eficiente e racional, contribuindo assim para minimizar perdas financeiras.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.

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Editado por

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Mar 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2024
  • Aceito
    17 Out 2024
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